5 Minicontos Karatis - FRANCISCO PASCOAL PINTO
1. Quarenta anos se passaram e a Coluna da Hora, embora lhe parecesse menor, permanecia firme em suas vértebras a sustentar o tempo que se acumulara na sua ausência.
2. Logo abaixo da barragem, cangatis e serranegras encastoados
em pedra, são registros de outra era; assim como na vazante da memória
ainda se emaranha e se debate na malha de rotas tarrafas com punho de crina de
cavalo suas mais remotas lembranças.
3. O “Horário” passa
com seus fantasmas em hora erma (meia-noite em ponto?) e atropela seus sonhos O
apito estridente, só os cães ouvem.
4. O sanfoneiro cego
na feira livre é o profeta dos bons augúrios. “Vai chover, negada!”, afirma e
reafirma, sem ciência do céu límpido onde plana solitário um urubu. Duvida há.
Mas só até o ribombar do primeiro trovão. Que negada aos olhos a luz, o seu
nariz romano capta perfeitamente na fornalha infernal do meio-dia
imperceptíveis indícios do inverno que toma chegada.
5. Na rua Senhor do
Bonfim, a velha casa. As janelas são um par de olhos tristes, cansados. Nem
acreditam que ele está de volta. Passos lentos, ele observa, esquadrinha
tudo. Como quem vai amarrar o cadarço do sapato, agacha-se. E disfarçadamente
cutuca com o indicador o buraco da calha que deságua na calçada. Era onde
jogavam castanhas de caju. Apostado.
“Quer comprar, moço?”, surpreende-o o atual proprietário da casa.
“Não tem preço”, ele diz sorrindo.
“Cuma?”