PARABÉNS, CRATEÚS!
Seis de julho. Aniversário de Crateús. Cento e oitenta anos...
Minha tarefa, hoje, é prazerosa e desafiadora! Ao invés de lapidar uma crônica, devo compor uma canção. Sim! Badalar o sino da aurora, entoar um hino de luz, concatenar as partituras de uma música de vida. Da mesma fonte em que brota a modesta prosa, há que germinar a genuína poesia. É festa. É o natalício da cidade!
Mas... O que cantar? Os paupérrimos lares que povoam as entradas da nossa zona urbana ou a beleza das mulheres que caminham como que desfilando sobre uma passarela? A sensação de amplidão que as nossas largas ruas despertam ou a comoção no peito que os pequenos mendigos de mãos estendidas provocam? A paisagem exuberante preservada na Serra das Almas ou o leito desfalecido do rio Poty?
Crateús, lâmpada referencial, que foste ‘orgulho do Ceará, terra da luz’, neste aniversário em particular, devemos ao mesmo tempo acender a vela da tristeza e repartir o bolo da alegria, pois sob a força da luz e a hesitação das trevas se forjou a nossa história.
Pulsante terra dos índios Karatius – comemoravam tudo e celebravam com regozijo todos os passos da linha histórica, desde nascimento à morte – que nos legou a compulsão festiva. A diversão está impregnada em nossa alma e deita raízes em nossos primórdios!
Bucólica fazenda Piranhas no século XVIII, quando os índios rareavam e a ganância se alastrava, ocasião em que foste abiscoitada por uma baiana descendente da Casa da Torre, Luiza Coelho da Rocha Passos, que assumiu o comando destas paragens e enviou um administrador, João Ribeiro Lima (posteriormente homenageado com o nome de uma rua no bairro Fátima I), construtor da capela que abrigou a imagem do nosso Padroeiro, Senhor do Bonfim, vinda da Bahia nos ombros de escravos.
Vila Príncipe Imperial, pertencente ao município de Marvão, estado do Piauí, que no dia 22 de outubro de 1880 protagonizou uma cena de nobreza e abnegação: a fim de que o Piauí tivesse acesso ao ilimitado espaço do mar, aceitaste que o teu limitado território passasse a pertencer ao Ceará.
Cidade de Crateús desde 1911, imperscrutável pátria de afeto, dolorida caldeira de desejos, espelhado cômodo de sonhos – foste capaz de portentosas atitudes de grandeza e gestos quase imperdoáveis de mesquinhez. Pelos trilhos da tua ferrovia, inaugurada em 1912, correu o trem como único transporte que levava e trazia os mantimentos essenciais para os corpos famintos e para os espíritos sedentos.
É claro que deves pedir perdão, senhora reverente, permanentemente ajoelhada ante o altar da Serra da Ibiapaba, por teus equívocos mais evidentes, como o percalço durante a passagem da Coluna Prestes, que, esperando a calorosa mão estendida da hospitalidade, recebeu o fogo ardente das balas, disparadas das torres da Catedral.
Impossível não relembrar, ‘Crateús, terra querida’, o provocado ataque de amnésia sofrido durante a ditadura Vargas, quando a ação criminosa de alguns soldados levou à fogueira documentos históricos da mais alta relevância, atas e livros importantes, gerando uma perda parcial da nossa memória.
Perdeste um pouco ‘do teu porte real de fidalguia, majestosa princesa do oeste’, quando aceitaste essa escura e quente vestimenta asfáltica, que encobriu a beleza do teu charmoso paralelepípedo e tornou atual a exclamação de Cícero na primeira Catilinária: O tempora! O mores! (Ó tempos! Ó costumes!). Se bem que a pedra da resistência permanece irremovível, impermeável e reluzente. E as águas da nossa principal artéria, a via liquida onde ‘a pequenina cidade surgiu um dia’, o rio Poty, nossa veia vital, envolto em lama, clama zelo pelo leito, reclama uma atitude de respeito.
Nestes 180 anos, despertemos para a imensa tarefa que nos convoca a dura realidade, de tornar melhor esta terra, para o bem de todos! Parabéns gerais!
(Júnior Bonfim)
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