Este
ano se fecha com a celebração do nascimento centenário de Luiz Gonzaga, o rei
do baião. Outros dois nordestinos são também centenários Jorge Amado e Nelson
Rodrigues. A saga de Luiz é fantástica. Desde o seu nascimento em Exu, a sua
fuga para se alistar no 23 BC de Fortaleza, os seus quase 10 anos de serviço
militar, ate sua morte em agosto de 1989, Gonzaga, descreveu uma vida de lutas
e conquistas memoráveis. Nunca se despiu de sua roupagem sertaneja. Nunca pois
de lado suas origens simples e pobres. Nunca fugiu do compromisso com o seu
povo nordestino. Nunca esqueceu sua origem matuta e pura dos sertões pobres e
sofridos do nordeste. Não se pode negar que a presença forte e marcante de
Januário na sua vida foi de uma imensa importancia. Dele bebeu sofregamente a
pureza das cantigas, das modinhas, dos xaxados e dos cantos chorados e doidos
destas plagas tão fantásticas. Dele herdou a magia da sanfona. E com a sanfona
Luiz se casou. A sanfona foi a sua companheira dileta. Com ela pode expressar
com talento a vida estética nordestina. Difundiu para o mundo uma riqueza que
durante muito tempo era confinada nas academias, nos livros, nos corredores das
universidades e nos laboratórios de estudo. Luiz rasgou estas cortinas e trouxe
a gente mais simples e mais pobre o canto e a beleza de um povo oprimido,
sofredor e magoado pela aspereza da vida. Pela fome crônica. Pela terra
inclemente. Pelo desprezo dos ricos e poderosos. Luiz foi o sociólogo primoroso
quando levou para o migrante as suas tradições e seus costumes. Luiz trouxe
para todos os pedaços do país o universo particular e familiar do nordeste.
Distante, saudoso, sofrendo as lonjuras de sua terra natal, o canto de Luiz é
um balsamo. É um afago. É um abraço na
partida infeliz. Foi mestre. Foi
psicólogo. Foi profeta. Foi teólogo. Fez ficar incólume os costumes dos
migrantes. Não permitiu o esgarçamento das praticas culturais nordestinas no
universo daquele que parte. Seu aboio foi estridente. Foi melífluo. Uníssono.
Afinado. Perfeito. Cantou a ecologia. Cantou os amores. Cantou os sofreres.
Cantou a esperança. Cantou o seu mundo com suas penúrias, suas belezas. Suas
traições. Sua dor crônica sustentada por políticos inescrupulosos e corruptos.
Fez muito Luiz. Longe de ser marginal, seu canto foi consistente. Foi frutífero.
Libertador. Toda esta filosofia estirada nos braços e nos dengues de uma
sanfona. Com o sotaque e jeito peculiar do nordestino. A sanfona poética de
Luiz move a vida e se estira no tempo. Relampeia na aurora. Dobra-se ao
crepúsculo. Faz cair a chuva. Faz molhar o sertão. Faz molhar a alma e deixar
os olhos se deitar sobre a saudade choradeira que cada um de nós carrega.
Fortaleza,
novembro de 2012
Jose
Maria Bonfim de Moraes- médico cardiologista.
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