sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

REPENSANDO O MEMORIAL


O mês de janeiro, precisamente o seu terceiro dia, assinala o natalício do maior gênio militar brasileiro: Luis Carlos Prestes. O gaúcho de Porto Alegre, aparentemente frágil na compleição física, era um verdadeiro gigante na estatura moral. A sua fulgurante trajetória - semeando os sonhos mais profundos da alma humana - o imortalizou como o “Cavaleiro da Esperança”.

Apenas para pontuar a força de seu dínamo mobilizador, no remoto 15 de julho de 1945, recém-libertado da prisão imposta por Getúlio Vargas nove anos antes, ele conseguiu lotar o estádio do Pacaembu, em São Paulo. Mais de 100 mil pessoas se acotovelavam para ouvir a voz do líder.

Sua fala contundente hipnotizou o público, que só o interrompia para calorosos aplausos. Na ocasião, o poeta maior das Américas, o chileno Pablo Neruda, leu uma saudação poética que encerrava assim: “Peço silêncio à América da neve ao pampa / Silêncio: com a palavra o Capitão do Povo / Silêncio: que o Brasil falará por sua boca”.

Prestes foi o principal insuflador da germinação libertária no Brasil do século passado. Liderou a maior cruzada cívica da história brasileira: a Coluna Prestes. Através dela, tocou as regiões mais lúgubres e as feridas mais sensíveis da pele da Pátria. Reacendeu e espalhou a tocha de uma sociedade mais justa e mais bela. O padre Geraldo Oliveira Lima, o cearense que mais pesquisou o assunto, nos oferece um parâmetro para aquilatar sua real dimensão: “A Coluna Prestes superou a marcha de Mao Tse-Tung, em número de quilômetros e em sacrifícios. É a maior marcha da Idade Moderna, e um símbolo de valores como ética e justiça. E Crateús é uma referência da passagem da Coluna pelo Ceará”.

A terra apadrinhada pelo Senhor do Bonfim galgou destaque por ter sido palco do único combate das forças revolucionárias. Geraldinho pontua em uma de suas obras sobre a passagem da Coluna através do Ceará: Frutuoso Lins, jovem em janeiro de 1926, narrou que quando o relógio bateu 3h “reboou uma saraivada de rifles e fuzis”. Lins explicou que João Calixto, guarda da Estação, revelou a euforia dos revolucionários no local: “Entre 4 e 5 horas da manhã, corriam eles pelas calçadas cantando ‘Mulher rendeira’ e gritando ‘Queima Chicuta’ e batiam com o coice do rifle nas portas da Estação”. O infante Gerardo Mello Mourão, assustado com o barulho da batalha, escondeu-se debaixo de uma mesa. Foi um confronto carregado de contorno épico. Isso conferiu a Crateús status de protagonista no enredo da Coluna.

Tive o gáudio de, na gestão do ex-prefeito Paulo Nazareno, ter integrado o grupo que participou da arquitetura reflexiva de um Projeto que visava resgatar e registrar esse singular fato da vida local. Àquela época, meados dos anos 2000, mobilizamos importantes segmentos da intelectualidade local e estadual discutindo esse desenho memorial. Lembro de uma produtiva reunião, realizada nas dependências do Estoril, na Praia de Iracema, quando compareceram vários próceres da esquerda cearense. As sugestões fluíam de modo cadenciado como a onda do mar à nossa frente.

Recordo que, em sua original concepção, o Projeto contemplava uma gama de ações distribuídas em três frentes:

1. Edificação de um Marco em homenagem à Coluna em local de grande visibilidade, preferencialmente na entrada da cidade.

2. Tombamento da Residência onde o Capitão Pretinho, disfarçado de mendigo, fora identificado e transformação daquele espaço em um Centro de Documentação e Registros da História da Coluna Prestes, reunindo ali um amplo acervo de pesquisa e informação. Tudo isso sob a coordenação da Universidade Estadual do Ceará – UECE/FAEC.

3. Construção de uma Praça, no Campo dos Vencedores, no bairro Ponte Preta, em homenagem aos membros da Coluna que tombaram em Crateús.

Dessas três ações, apenas uma se concretizou. Há cinco anos, em 14 de dezembro de 2004, foi inaugurado um marco à Coluna na Praça da Estação. É o quarto do Brasil. Único no Ceará assinado pela grife de Oscar Niemeyer. Quando miro essa obra, fincada em local impróprio, fico imaginando o quanto ignoramos sua importância histórica. Parece que é apenas um irrelevante espigão de concreto. Quase ninguém se detém a perscrutar sua significação simbólica. Até porque inexiste sequer uma pequena placa descritiva do Marco.

A praça está sendo objeto de reforma. Se tivesse ocorrido uma discussão prévia com a população, esse poderia ser o momento de recolocá-lo em local mais adequado.

É hora, também, de ressuscitarmos esse debate. Requalificando-o. Repensando-o na direção de sua contribuição ao futuro. Pois exemplos de dedicação, heroísmo e compromisso com as mais elevadas causas sociais precisam ser ressaltados.

A saga da Coluna Prestes, com seus arroubos equivocados e seus rumos certeiros, constituiu o mais expressivo movimento nacional rumo ao império da justiça e ao reino da liberdade.


(Por Júnior Bonfim – na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro-Oeste, Crateús, Ceará)

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

"Isto é uma vergonha!"

"Que merda: dois lixeiros desejando felicidades do alto da suas vassouras.
O mais baixo na escala do trabalho."
Hoje não liguei a TV, não ouvi o rádio, nem quis saber da internet. Atitudes preconceituosas e desrespeitosas como a de Bóris Casoy me envergonham, atingem em cheio o meu orgulho de ser brasileira. Ligar a TV é ter que dar de cara com uma burguesia arrogante e desmedida, que embora se sustente na força do trabalho dos homens simples, ao fazer uso de uma hipocrisia disfarçada de generosidade, se apresenta a eles como solidários.

A mídia no Brasil é porta-voz da elite, nela a classe trabalhadora não tem espaço, se aparece na TV é para protagonizar a miséria e as mazelas sociais, para serem os coitados que os programas sensacionalistas necessitam para que seus apresentadores e patrocinadores sejam generosos. A miséria no Brasil dá IBOPE.

Mas um dia alguém se esquece de apertar um botão, de desligar um fio, de apertar um parafuso, e sem querer vem à tona quem verdadeiramente se esconde por trás da aparência solidária dos homens da TV. Foi assim, quase sem querer, que Bóris Casoy mostrou sua verdadeira face, que se confunde e se mistura a face de toda burguesia, a quem garis são simplesmente lixeiros, que ofendem pelo simples fato de aparecerem num jornal desejando felicidades ao povo.

Não fecho os olhos à hipocrisia de meu País, mas muitas vezes tenho vontade de fazer o que diz a canção de Renato Russo, porque “... se o mundo é mesmo parecido com o que vejo, prefiro acreditar num mundo do meu jeito.” Nele garis são heróis, enfrentam todos os dias a indiferença das pessoas nas ruas e colhem de lá toda sujeira que depositam.

Lamento que a sujeira maior os garis não possam limpar, nem colher como lixo, porque esta está na mente perversa dos homens.

É como Renato Russo que eu me pergunto: “Que País é esse?”

Isis Celiane