Afirmam os estudiosos, ao
analisarem a infância, que de um mês aos três anos, nas crianças em plena
maturação, principia uma vivacidade que vai brotando, levemente, das meigas
pétalas da inocência. Dizem que se desenvolvem os inúmeros reflexos, realça-se
a percepção de pessoas e coisas, um sorriso prazenteiro se estampa no rosto e
salienta-se a sensível curiosidade em descobrir tudo ao seu redor, concluem com
altivez os eruditos da pedagogia. Mas se um irrequieto menino é dotado,
inexplicavelmente, de uma esperteza maior, tudo vem medrando mais cedo e as
inesperadas surpresas vão assustando os incrédulos professores, os parentes
arregalam os olhos, para orgulho dos genitores.
- Reparem como meu filho é
inteligente! Diz a mãe vaidosa, mostrando alguma façanha do pirralho, aos
sobressaltados vizinhos. São os geniozinhos que, aqui acola, surpreendem e
assustam o mundo.
O batismo foi na Igreja da
Matriz, com ablução de água benta pelo Padre Eliesio, um renascer espiritual,
mas que para o menino Karlo David não foi o suficiente, pois um ser intrépido
tem que ser purificado é no ardor do fogo. Logo que completa um ano, David se
encanta com a luz proveniente das brasas de uma fogueira. A claridade, o
princípio de tudo, a causa primeira do próprio existir, alumbrou o menino de
Dona Raimundinha. Quando correram, em desesperado socorro, David já estava com
uma brasa incandescente nas pequenas mãozinhas, num batismo de fogo, que é a
iniciação de todo guerreiro. A marca, que o acompanhou pela árdua vida,
confirma mais que um renascer espiritual, denota a manifestação de fibra que
se apresentou na raquítica criança, como sinal de extraordinária coragem para o
homem que iria enfrentar os desafios e os mistérios do mundo.
O Menino cresce e frequenta a
escola para apreender a vida como as crianças pobres da Rua Cel. Tobias, mas
não é um deles, tem incumbências que aos pouco vão se revelando na
responsabilidade em cumprir suas obrigações e deveres, no talento para os
desenhos que impressionavam os adultos, na preocupação social em querer
proteger o velho e intermitente Rio Poti, eternamente sufocado pela poluição,
na vivacidade do raciocínio e do olhar, que adquiriu do braseiro que queimou
sua mão e na modéstia da alma, força que nunca perdeu.
Na gloriosa e tradicional
Escola Técnica de Comercio Pe. Juvêncio, patamar sólido das vitórias de muitos
cidadãos, revelou a aptidão pelo estudo das Ciências Exatas. Estudar é um
trabalho difícil, pesadíssimo, comparável a brocar uma roça no pino do
meio-dia. É um fino dom e arte, coisa para poucos! E dedicar-se a Física? Só
para os eleitos, que estudam mais que os outros e vivem queimando neurônios!
A claridade da Física de Isaac Newton, mesmo vindo da luminosidade de uma brasa, princípio de tudo, causa primeira do próprio existir, um dia alumbrou o
espírito irrequieto de David. Os Físicos são aves raras, profissionais de ponta
que fazem com que as pessoas olhem com espanto e mentalmente declarem: - Ah,
isso é que é Físico? Mas é um ser em carne e osso! Sim, e num cidadão comum,
como David, é que se resguardam os tesouros de um País, numa profissão que alavanca
o desenvolvimento de um povo e que o Brasil pouco soube valorizar.
Um dia, para minha surpresa e
espanto, recebo a ligação de David: - Prof. Raimundinho, gostaria de lhe
convidar para uma aula inaugural do curso Teoria da Relatividade, aqui na
Universidade Estadual do Ceará. Aceitei com satisfação o honroso convite. Um
auditório lotado de mentes jovens, com um belo futuro pela frente, assistindo
uma aula de Teoria da Relatividade de Albert Einstein ministrada pelos dois
únicos Professores-doutores, e foi a única vez que vi dois pós-doutores
presentes na cidade de Crateús, pois David havia convidado o amigo, pesquisador
de Física das Partículas Elementares e Campos, com ênfase em Teoria de
Supercordas, Prof. Dr. Leandro Ibiapina Beviláqua para juntos ministrarem um
curso de uma semana. Estava sem acreditar... Em Crateús? Fiz questão de
repetir, mentalmente, a pergunta: - Isso está acontecendo aqui mesmo, no meu
Cratheús?
Alguns Jovens, crateuenses
daquele auditório, tinham sido meus alunos , via-os agora cavalgando num raio
de luz, como velocinautas no tempo e espaço da Ralatividade, viajavam para um
futuro bem melhor, um porvir que meus olhos podiam ver, estava ali na minha
frente!
Aquele menino, que mostrou uma
responsabilidade social pelo seco Rio Poti no começo da década de 90, apontava
o destino daqueles ansiosos universitários e demostrava o amor pela terra em
que nasceu, quando muitos - quase todos - ao se verem com um diplominha de
nível de nível superior nas mãos, criam asas, debandam e esquecem o torrão em
que nasceram.
O conhecimento nos faz responsáveis. Se nossos “doutores”
tivessem um por cento da afeição que tem o Prof. Dr. David, por Crateús,
seriamos um município bem mais desenvolvido, pois o guerreiro resolveu ficar,
fazendo o bem para sua gente, ajudando a juventude a conseguir um futuro digno.
Um determinado dia, o Prof.
David convida o Químico, também professor e ex-aluno, André Aguiar a levarem o
nome de Crateús até o longínquo Rio Grande do Norte. Eles concorrem no II
Encontro Nacional de Química e arrebatam o Troféu “Erlenmeyer de Ouro”, e esse
é somente um exemplo do impulso que o nosso Físico impõe na mente de nossa
juventude.
Como David, o profeta Rei de
Israel, que era dono de muitos dons, da música, da dança, da poesia e dos
salmos, David , nosso Profeta da Física, é o dono do pensamento mais feliz de
Einstein, quando disse que ao mergulhar no mais profundo silêncio a verdade se
revelava. De meu incomum e longo silêncio vejo a verdade da Física do bem e da
bondade iluminando os caminhos de nossos jovens com uma acesa brasa da sabedoria na
mão. Só quero confirmar, com essa breve história, que, Karlo Einstein David
Saboia, é um crateuense que tenho orgulho de ser conterrâneo!
Raimundo Cândido