sexta-feira, 28 de junho de 2013

Piauí terra querida...

( De Maria José Carvalho Coelho, sobrinha do Ilustradíssimo e saudoso  Nonato Bonfim, professora na cidade de Salvador - BA e trabalha poesia(cordel) com seus alunos – Nasceu em Campo Maior – terra da Batalha de Jenipapo, de Gonçalves Dias e Torquato Neto)

“Piauí terra querida
Filha do sol do equador”
Por isso és bela e quente
Feita torrente de amor

Eu sou da terra das serras:
Das Confusões, da Capivara
Presentes dado por Deus
Ao mundo que Ele criara

A Chapada do Corisco
Tem valor inestimável
Em São Raimundo Nonato
Tem arqueologia notável

Temos rios cachoeiras
Até um braço do mar
Fica em Luís Correia
É lindo cê vai gostar!

O Delta do Parnaíba
É nosso cartão postal
Visite ele pra ver
Que Deus só fez esse igual

Único em mar aberto
Das Américas é o maior
Com 66 km de extensão
Ecossistema, o melhor.

Sou de uma terra linda!
E com muitas coisas raras.
A opala pedra preciosa
Em dois lugares encontras

No Piauí tem de tudo
Ilhas, lagoas, igarapés
Praias de areia fina
Tem hotéis e tem chalés

Temos dunas e coqueirais
Tem o Morro do Gritador
Tem a Cidades de Pedra
Que ao mundo encantou

Tem a Pedra do Castelo
Cachoeira do Urubu
Tem a Lagoa do Portinho
Vamos lá fazer um tour.

Temos frutas exóticas
Bacuri e buriti
Encontradas no cerrado
Como o famoso pequi

Pequi é afrodisíaco
Rico em vitamina A
Por isso somos saudáveis
Não temos do que queixar.

Nós também exportamos
Carnaúba, algodão,
A cera, soja, castanha,
Manga, caju e mamão...

Temos também a mamona
Que vira combustível
Pra fazer o carro andar
E chamam de biodiesel

“Minha terra tem palmeiras”
E verdes carnaubais
As aves também gorjeiam
Saudando belos pardais

Temos festas populares
Bumba-meu-boi, Zambelê,
Temos lendas, marujada...
Tem festejos pra se vê

Sou filha de Campo Maior
Cidade linda e acolhedora
Tem a melhor carne do sol
Pra fazer comida boa

Foi lá em Campo Maior
Que lutamos por liberdade
Pra nos livrar de Portugal
E toda sua crueldade

A Batalha do Jenipapo
Foi “guerra” de três estados
Contra as tropas de Fidié
Lutamos sem ter soldados

Em 13 de março de 1823
A batalha foi decidida
Foi bom pra Independência
Mas pra história esquecida

Faltou vontade política
Pra fazer divulgação
E validar nossa luta
Nos livros da Educação

Nossa bela capital
Chama-se Teresina
Auspiciosa, hospitaleira
Tem cheiro de cajuína

Bebida que vem do caju
Feita sem muita proeza
Tem um sabor refrescante
Igual a mãe natureza

Da Costa e Silva fez o hino
Do meu belo Piauí
Teus filhos cantam e encantam
Tal qual um pitiguari

Sou da terra de Torquato Neto
Sou matuta sou brejeira
Sertaneja, ribeirinha
Piauiense matreira

Piauí terra querida
Majestosa, altaneira
Orgulho de ser sua filha
Terra amada, brasileira.

Maria José Carvalho Coelho

Direitos autorais reservados

quinta-feira, 27 de junho de 2013

Cratheús Aguerrido.

                                                              
           Os vespertinos raios do sol mal banham a superfície cristalina do Rio Poti quando este, repentino, muda de leste para o norte num fluir sinuoso, rumo ao paredão da Ibiapaba, delimitando o agreste palco dos Sertões de Cratheús.
O tablado dos acontecimentos históricos, ornamentado por galhos retorcidos de aroeiras, angicos, juazeiros e catingueiras, esquadrinhado pelos preás, tatus-bola e veados-catingueiros foi, e continua sendo, o lugar de épicos, comédias e tragédias de um povo aguerrido no seio da caatinga inóspita. Por aqui, sucederam-se grandiosas obras teatrais de fazer inveja aos gregos Ésquilo, Sófocles e Eurípides.
Desumanos Mestres-de-Campo são convidado por Francisco Garcia d'Ávila, proprietário da Casa da Torre, na Bahia, para aniquilar os índios, por toda essa região.
A expansão pastoril do Castelo da Torre não conhecia limites, com uma audaciosa ganância, às avessas ao mar, Domingos Jorge Velho e Diogo Afonso Sertão, dos Ávilas, vinham desbravando o Piauí. E os Kara-thi-us, de lanças e arcos nas mãos, não puderam combater os bacamartes de boca sino cuspindo raiva e fogo na rudimentar guerra de um agreste palco, configurando-se a primeira derrota do destemido sertão.
Apaziguado os ânimos dos gentios, vai surgindo, pouco a pouco, um povoado nas margens do rio das piranhas, seduzido pelo aromático estrume dos currais e pelo ecoar dos aboios a tanger o gado.
Do tronco da velha fazenda Piranhas, nas margens do Poti, esgalha-se a futura Vila Príncipe Imperial, esparsa e bucólica num esboço rústico, mas já exibindo cenas de um tumultuoso velho oeste, necessitando de periódicas intervenções dos emissários da arcaica cidade de Oeiras, nossa primeira capital. E já vibrava, pelas empoeiradas ruas, um DNA aguerrido das famílias Melo e Mourão, que duelavam entre si, a sangue e ferro, conclamando o duro pulso de uma força policial.
Foi tal qual uma Guerra interna, mas estendeu-se por pastagens longínquas, bem fora do nosso domínio, atraindo os olhares dos administradores da Província e os rancores Imperiais.  Do alto de seu trono, Dom Pedro II ordenava ao Pe. José Martiniano de Alencar: - Acabem com a raça dos Mourões!
Era Alexandre da Silva Mourão IV, caráter belicoso, que atraía para si todas as atenções numa época de irrefreado cangaço. Quando não guerreava diretamente, usava a sabedoria de submeter o inimigo sem combate, que o diga o Tenente Felix Bandeira, com 40 soldados bem armados, cansou de percorrer as veredas dos sertões no encalço do ardiloso e desalmado cangaceiro, filho do célebre Alexandre II, que fizera parte da Batalha de Jenipapo enfrentando as tropas do português Fidié, que tinha pretensões de manter esta região sobre o domínio lusitano, surgindo assim, o Movimento Separatista de Oeiras. Uma manifestação genuinamente brasileira.
Foi no tempo em que, nos conflitos dos sertões bravios, os viris sertanejos ao falar em guerra, até as suas palavras tinham o peso do chumbo e a ligeireza das flechas. Como a capital Oeiras, Cratheús também proclamou uma independência dos domínios lusitanos, é o que afirma um trecho vago de um antigo documento: “O povo de Príncipe Imperial e Marvão, por pretenderem levá-lo ao criminoso Partido de Libertação, advertimos que não tendes proporções para a Independência. Falta-vos agricultura, arte, ciência, manufatura, comércio, dinheiro e, sobretudo, Exército e Marinha”
À sombra das ordens do Cel. João de Araújo Chaves, 300 homens dos Sertões de Crateús e Inhamuns, a 13 de março de 1823, juntaram-se as tropas de vaqueiros e roceiros do Piauí, para um combate feroz nos barrancos do Riacho Jenipapo, próximo à Vila de Campo Maior.  Quando Dom Pedro I, às margens do Ipiranga, deu o grito de “Independência” não se derramou uma só gota de sangue, mas na sangrenta Batalha do Jenipapo, que assegurou a unidade territorial do Brasil, o combate foi brutal, causando a morte de mais de duzentos bravos sertanejos, toscamente armados com facões, espingardas socadeiras, foices e até mão de pilão, em cinco eternas horas de agonias, tempo que durou a malograda batalha e que foi uma vitória de Pirro para Fidié, derrotado logo em seguida, na vila de Caxias, no Maranhão.
O poeta da Itabira, Carlos Drummond de Andrade, em reconhecimento à ação dos combatentes independentes de jenipapo, imortalizou-os no poema “Cemitérios”: “No cemitério de Batalhão os mortos do Jenipapo / Não sofrem chuva nem sol; o telheiro os protege / Asa imóvel na amplidão campeira.”
A lendária vida dos rudes homens do cangaço, expulsos de suas terras, tostados pelo sol e amaldiçoados pelos sangue das almas que abateram, é um padecer sem fim. E Alexandre Mourão IV, o mais famoso cangaceiro dos Sertões dos Kara-thi-us, vê a oportunidade de se redimir dos inúmeros crimes com uma Revolução que se alastra no Maranhão, A Balaiada.  Alista-se aos 200 soldados que sobem à Serra dos Tucuns sob o comando do Cap. Antônio José Luís de Oliveira, para ser absorvido de seus delitos e poder voltar a uma legalidade.
No Maranhão, os ricos fazendeiros, num sarneísmo antecipado da aristocracia rural, por conta de uma dura crise econômica impõem perversa fome e maus-tratos aos vaqueiros e escravos, que se incitam e começam uma revolução na terra em que nasceu e viveu o poeta Gonçalves Dias. O vaqueiro Raimundo Gomes, o balaieiro Manoel dos Anjos e o quilombola Cosme Bento emprestaram coragem, força, alma e sangue aos revoltosos balaios.
Em 1841, Alexandre Mourão IV, e alguns de seus parentes crateuenses, seguem uma tropa de 8 mil soldados, com farto armamento de guerra, para a Vila de Caxias, para lutar ao lado do Coronel Luiz Alves de Lima e Silva, aniquilando impiedosamente 12 mil pobres sertanejos, vaqueiros, agricultores e escravos e, com isso, o desumano Coronel Barrão foi premiado, passando a se denominar Duque de Caxias e o nosso herói cangaceiro retorna ao seu torrão, livre, puro e sem piedade, como um carcará que revoa pelo sertão!
  Em tempo de guerras os homens viram tigres, dizem. E deve ser verdade, pois estávamos até no maior conflito armado da América do Sul: A guerra do Paraguai! Um estéril combate em que morreram mais soldados por doenças, fome e exaustão física do que propriamente pelas ação das balas. No livro, A retirada da Laguna de Visconde de Taunay, capítulo XIX em que fala da passagem do Rio Miranda, em cheia alta, lemos o feito heroico do soldado Damásio, um corajoso crateuense, quando tentavam passar quatro pesados canhões pelas correntezas do rio pantaneiro, sobre troncos de árvores, tracionados por cordas e polias. A primeira peça, passa tranquila, com estrepitosa aclamação dos soldados do outro lado. Já a segunda peça, escapou das amarras e caiu no fundo do rio. Leiam agora na própria “voz” de Taunay: “Um soldado, cujo nome merece ser recordado, Damásio, ofereceu-se imediatamente para mergulhar no ponto da imersão, e, tendo conseguido reconhecer o fundo, pode, após duas ou três emersões, para tomar fôlego, passar em torno da peça uma corda de que se provera e serviu para a puxar. Foi a lição aproveitada quanto aos cuidados tomados com a amarração das demais bocas de fogo e apressou o resto da operação, permitindo completar a passagem à tarde daquele dia e na manhã seguinte.” Desta guerra, conhecida também como o massacre dos meninos, nenhum pais envolvido teve algum proveito: O Paraguai com 100 mil mortos, entre soldados e crianças inocentes,  ficou em ruina total, já o Brasil, com a fragilidade da estrutura militar exposta e 50 mil brasileiros mortos por doenças e pelos rigores de um clima!
Quando o beato cearense Antônio Conselheiro, espectro vivo a rezar ladainhas, liderava 20 mil sertanejos na comunidade de Canudos, na Bahia, o Exército Brasileiro tentou por três vezes aniquilá-los, na rústica arapuca de um arraial. De Belo Monte, que na realidade era um vale, o radical devoto dizia: - A República é materialização do reino do anticristo na terra. Quando, no dia 5 de outubro de 1897, a 4ª Expedição Militar disparou um tiro de canhão atingindo a torre da Igreja, os sertanejos que já sem água e sem comida e mesmo assim não se renderam, um crateuense estava lá! Francisco Lopes Ferreira Lima incorporado a um batalhão, viu o massacre de milhares de marginalizados do sertão nordestino. Presenciou quando um velho, uma criança e dois sertanejos, os últimos insurretos, ficaram honrosamente de pé, na frente de 5 mil soldados que rugiam como animais para o desfecho final da batalha e também viu quando os agarraram pelos cabelos, dobraram-lhes as cabeças, engargalando-lhes os pescoços e, francamente expostas suas gargantas, os degolaram. 
Nos, Crateuenses, lutamos até na floresta Amazônica participando da conquista do território do Acre. Foi quando chegou por aqui, no início do século, o conterrâneo José Francisco da Silva que guerreou ao lado do Cel. Plácido de Castro, e trouxe a notícia da expulsão dos invasores bolivianos da região. O Acre é o Estado Brasileiro que todo dia 15 de junho, data da elevação à condição de estado, hasteia três bandeiras em seus pavilhões: a Brasileira, a do Acre e a do Estado do Ceará, em homenagem aos heróis cearenses-crateuenses que lutaram na Revolução Acreana. Podia hastear a bandeira crateuense, também!
Não fomos a 1ª Grande Guerra mundial, em 1914, chamada de Guerra das Trincheiras onde os soldados morriam se contorcendo como baratas pelos corrosivos gases mostarda e cloro. Mas em (des)compensação estivemos na Sedição de Juazeiro, um ano antes da seca do 15.  Na remota década de 20, quando o menino Norberto Ferreira Filho não estava entregando pão da padaria de seu pai ou colocando água das cacimba do retiro, ficava ouvindo as conversas do velho sapateiro Moises Almeida que havia tomado parte na Revolta de Juazeiro do Norte, nos Sertões do Cariri, integrando as forças do Governo Federal que lutaram contra os jagunços de Floro Bartolomeu e do Padre Cícero Romão Batista. Ferreirinha aprendia a arte de Heródoto e ficou sabendo que o velho Moises havia perdido a guerra e que o excomungado Padim Cícero permaneceu como eminência parda na política cearense, com uma população de sertanejos venerando-o, feito santo, feito profeta.
Já na 2ª Grande Guerra estivemos em número bem maior, pois o Exército saiu a catar soldados, ou se ia para o fronte de batalha ou para a Guerra da Borracha, enfrentar animais perigosos e a maleita, no seio da Floresta Amazônica.
Os Expedicionários brasileiros-crateuenses foram incorporados às tropas americanas e ficaram entrincheirados nas encostas do Vale do Reno, em Monte Castelo, onde enfrentaram a 232ª Divisão de Infantaria Alemã, à temperatura de 10°C negativos e com neve até o peito. Ouviam, constantemente, os disparos dos inimigos e os estrondos das granadas que pipocavam ao lado. O herói crateuense, Francisco Bezerra Lima, o Chico da Doninha, entregador de água em jegue e amigo de Seu Ferreirinha, foi ferido duas vezes no eufêmico “Teatro de Operações” e recebeu um certificado de liberação, para ir para casa.
Os alunos do Instituto Santa Inês, tendo à frente a professora Madrinha Francisca, receberam o guerreiro cantando: “ Você sabe de onde eu venho? Das margens crespas dos rios, / Dos verdes mares bravios / Da minha terra natal. / Por mais terras que eu percorra, / Não permita Deus que eu morra / Sem que volte para lá; / Sem que leve por divisa / Esse "V" que simboliza / A vitória que virá: / Nossa vitória final, / Que é a mira do meu fuzil, / A ração do meu bornal, / A água do meu cantil, / As asas do meu ideal, /A glória do meu Brasil.” Foi uma grande festa para recepcionar um herói crateeuense!
Mas nem tudo são flores na vida de um ex-combatente, veterano de guerra. O Chico da Doninha, cidadão educado e tranquilo, não podia experimentar a danada da cachaça Lagoa do Barro. Quando chegava num bar, só ficava o dono com as pernas tremendo, atrás do balcão. Os vapores do álcool liberavam os pesadelos do “Teatro de Operações” e o coitado do Chico ouvia os gritos dos companheiros feridos e os estrondos das granadas. Então, como em Monte Castelo, desfechava tiros a torta e a direita e jogava facas afiadas ao encontro dos troncos das árvores.
O povo, que olhava das janelas entreaberta, penalizado dizia: - Coitado, pegou a maleita da guerra!
Certo fez o novo orientense, crateuense Sargento Hermínio Aurélio Sampaio - que um dia, no prédio quadrado da atual prefeitura, atocaiou o bandoleiro Alexandre Mourão IV- ele resolveu se transformar em herói e na madrugada do dia "D", o momento mais importante de 2ª Guerra, enfrentou as gargalhadas sinistras dos morteiros inimigos. Naquele fatídico dia, estava com uma pá na mão e preparava uma posição para um Fuzil Metralhador, sempre a gritar:  - Precisamos avançar! Venham comigo!  Súbito, uma rajada certeira e mortífera o fulminou,  ali tombou o Sargento Sampaio que não quis passar, como o Chico da Doninha, pelas maleitas de guerra nas ruas de sua cidade, resolveu permanecer na Itália, sepultado no cemitério de Pistola, onde estão os corpos dos membros da Força Expedicionária Brasileira. E pelos primeiros indômitos karatis que tombaram na árida caatinga, pela geração de Mourão com bacamarte na mão, pelo soldado Damásio, pelos Franciscos, pelos Moises, e por todos os outros extraordinários guerreiros crateuenses, damos vivas aos nossos heróis!
Raimundo Cândido



 (A crônica “Cratheús Aguerrida” não se pretende alçar de rigidez histórica, mas seus dados podem ser comprovados nos livros: Fatos e Cousas do Passado e Coletâneas 1 e 2 de Norberto Ferreira Filho, Meus Avós de Raimundo Raul Correia Lima, Inhamuns, Terra e Homens de Antônio Gomes de Freitas, A retirada da Laguna de Visconde de Taunay e Diversos Documentos antigos de Crateús que estão no Instituto Histórico e Geográfico do Piauí.   E aos que me cobram precisão de fatos e épocas peço, se possível, que coloquem esta narrativa na gaveta dos pretensos textos literários.)
José Alberto de Souza disse...
Esta crônica Cratheús Aguerrida" tem a sua importância marcante na medida em que faz um levantamento sucinto de todo o passado heróico dessa brava gente do Ceará. Através de todos expoentes épicos que deixaram seus nomes registrados em diferentes obras de autores consagrados. E que Raimundo Cândido teve a paciência de compilar, demonstrando assim como historiador mais uma de suas facetas.