sábado, 11 de maio de 2013

PROCURA-SE!



Uma translúcida forma de vida
que borboleteou-se nos ramos silvestres
desvelando-se num encanto,
pois ao furtar a luz com suas pétalas,
acordou o ciúme das flores do campo!
Foi a Flor de Algodão?
Não! Ela só é alegria e afeição!
Teria sido a Flor da Catingueira?
Que doa-se em amarelidão
e há quem, assim mesmo, a queira...
Não! Não!
Então a Flor do cacto,
pelo êxtase e pela cor
firmando-se num pacto?
Também não!
Ah, a Flor do cajueiro...
Aquela que se usa para o amor ligeiro?
Ou a Heliconia enganosa,
num colorido colar venenoso?
Ou o talo felpudo em neve
da jurema preta?
A incrível forma roxa e laboriosa
da flor do maracujá... Será?
Ou a pérola pura e rosa
e branca e bela do Muçambê?
Ou o broto vermelho do Pião
que se oferta em comunhão?
Com certeza, essas formosas, não foram!
Elas padecem! Elas choram!
Infunde-se todas as suspeitas
sobre a cigana GITIRANA DE LUZ
que, entre as flores mil,
voluptuosa brilha, brilha... E reluz!
RAIMUNDO CÂNDIDO


Zacharias Bezerra de Oliveira disse...
E se reproduz num brilhar profundo
como aquela majestosa flor
do pé de mufumbo
e o profundo amor
do poeta chamado Raimundo!

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Tetéu

         
             

Um graveto estala!
Calango corre,
gavião vigia
desarrulha a juriti,
caburé se esconde,
e a passarada se cala...
Silêncio sepulcral...
Mesmo assim,
o quero-quero decola,
avião de caça
por encargo natural,
e alardeia:
-Téu-téu... -Téu-téu...
Ase indomável,
peitando todo risco!

Raimundo Cândido

segunda-feira, 6 de maio de 2013

O Teovídio e as proezas de um espírita.



            Na primeira página do livro O Telvídio, editado há 74 anos, estampa-se a foto do Dr. Luiz Chaves de Melo, descendente dos poderosos coronéis da cidade de Santa Filomena, no Estado do Piauí. No rodapé, bem abaixo do retrato, lê-se: Doutor em Medicina pela Universidade de Chicago, Estados Unidos e Farmacêutico pela antiga Escola de Farmácia do Pará. Na apresentação da obra é o próprio autor quem nos informa, “Jesus Cristo disse: - Tempo virá em que no mundo habitará um só rebanho governado por um só pastor.”  Dr. Luiz, o benfeitor dos pobres, nos esclarece o que significa esta afirmação bíblica: Chegará o dia em que, no mundo, só haverá uma religião e os fiéis serão guiados pelo único pastor que será o nosso amado Mestre. O benemérito Médico e Enfermeiro confirma ser um profundo conhecedor do espiritismo de Alan Kardec. 
Telvídio é um termo grego-latino que significa aquele que vê de longe e no livro é um dos personagens, o arcanjo da corte divina enviado pelo Eterno, que aconselha e orienta a inexperiente Consciência Brasil. Quando o Dr. Luiz Chaves de Melo não encontra-se, caridosamente, receitando o povo pobre de Crateús ou exercendo entusiasticamente o direito de cidadania nos embates políticos com Coronel Jerônimo de Sousa Lima, o famoso Cel. Jiló, com certeza está escrevendo os diálogos entre Telvídio e um desatento Brasil, um povoamento simples e ingênuo, naquela época. No dia em que o iluminado espírita se foi, o arcanjo protetor o acompanhou e nunca mais voltou para nos recomendar nas boas doutrinas e nos bons preceitos. Dr. Luiz escreve notas criticando os adversários no Jornal o “Unitário”, enquanto seus oponentes, o Cel Jiló, o Juiz Apolônio Perga Bandeira Barros e o Cincinato Rodrigues defendem-se no Jornalzinho “A Republica”, os dois periódicos crateuenses da época.
Quando jovem, possuidor de um ávido espírito aventureiro, andou lá pelo lado da Amazônia, um território desbravado pelos crateuenses desde a Guerra da Borracha.  Ele relata, no livro espírita raríssimo: “Uma tarde eu andava nas matas dos Solimões e me perdi.” Começa assim, a narrativa de uma saborosíssima aventura!
“Eram três horas da tarde e pareciam seis da noite devido às enormes árvores, entrelaçadas e tenebrosas. Eu me sentia como que afogado naquele imenso mar de verdura. No desespero, procurava a estrada e um anoitecer, o manto assustador da floresta, é o que eu ia avistando. Subi em um colossal Jequitibá ficando cheio de espinhos, repleto de lianas silvestres, ferroado pelos carapanãs e pelas formiguinhas miúdas e vermelhas que produzem uma dor insuportável. Equilibrei-me num dos seus ramos mais altos. Na escuridão úmida só ouvia a pulsação do meu coração.
À noite, um vento fortíssimo começou a soprar. Plantas altaneiras caiam e arrastavam outras árvores, em sua pesada queda. O Jequitibá, em que estava, balançava-se como as jangadas que singram os mares bravios das terras de Iracema. Assovios, gritos indígenas, uivos de feras sintonizavam com a fúria dos elementos. Um rifle, cinquenta balas, uma caixa de fósforos, era tudo que eu possuía naquela hora de infortúnio. A chuva prosseguiu até alta hora da noite. Dormente e apavorado, sentia o coração parar nas diástoles. Passada a chuva, todos os animais daquela pavorosa selva, excitaram-se farejando as presas, e vinham ululando, gritando, tornando mais lúgubre a hediondez das matas. Avistei luzes que pareciam pirilampos, mas à medida que o clarão se aproximava, distingui, apavorado, índios com fachos de luzes acesas. Na certa eram caçadores de tatus, para os festins guerreiros. Os índios passaram sem dá por mim.
Distingo duas onças perseguindo uma enorme anta, que foi logo devorada pelos felinos. Quando já me dispunha a cerrar os olhos e tirar um cochilo, vejo um vulto vestido de branco, em baixo da árvore. O vulto me diz: - Desça! Desça daí e não me dê trabalho!
Eu, amedrontado, tomei do rifle e me dispus a atirar, mas desisti e principiei a rezar, mentalmente. Desci e ao aparecer mais dois vultos, criei coragem para perguntar:
- Em nome de Deus, como você se chama?
- Eu sou o Capitão Pereira, bicho pesado, dono destes seringais. Matei muito para roubar e enriquecer. Um dia os índios mataram-me com flechas envenenadas. Ando vagando, sempre perseguido por essa mulher e por esse negro. Peço-te que rezes por mim. Que me liberte deste sofrimento! Os vultos desaparecem, tão logo termina de falar.”
A aventura do Dr. Luiz pela floresta amazônica continua, cada vez mais emocionante.
“Fiquei ali até o dia aparecer. Com os primeiros raios de sol, volto a procurar a estrada e a encontro depois de muito andar. Chego nas margens de um rio e vejo uns canoeiros que passam remando uma ubá. Dou-lhe sinal e eles me levam rio acima. Conto todo meu sofrimento e me dizem que foi uma felicidade escapar daquelas matas assombradas, onde há muitos anos corre a história do capitão Pereira. Chegando ao seringal tratei de procurar um meio de partir para Manaus.
Na capital amazonense fui convidado a uma reunião espirita na casa de um engenheiro, homem que se dizia de grandes conhecimentos. Na sessão foi lido o Evangelho na passagem relativa a Lázaro e antes disso terminar um espirito atuou numa das moças presentes. Manifestou-se com essas palavras: - O Dr. C. M. esteve perdido nas matas às margens do Rio Solimões e viu-se, frente a frente, com o Capitão Pereira, antigo dono dos seringais daquela região. Fiquei surpreso e perguntei ao espirito a causa daqueles acontecimento. Dele recebi essa resposta: - Em séculos passados foste um capitão de piratas, prendia ricaços e potentados, mas se te pagavam bem, soltavas os presos sem demoras. Em passadas eras, expiando os crimes da tua pirataria foste mendigo, noutras foste curandeiro, médico, rico e miserável, e assim será até que teus crimes sejam punidos.”
No Telvídio, um alfarrábio amarelado, já se esfarelando pelo tempo, lemos esse parágrafo: Deus, na sua infinita bondade, dá sempre aos seus filhos os meios de progredirem e de se santificarem pelos próprios esforços. Dá-lhe, ao mesmo tempo, mestres e amigos para ensinar-lhes a distinguirem o bem e o mal e a conhecerem as leis que formam o que se chama – Ciência.
Em Crateús, na décadas de 30 e de 40, ao fim de um dia de labuta, saindo do descorado casarão da Rua Cel. Zezé com a Rua João Tomé, o Dr. Luiz Chaves se dirige para linha férrea no intuito de distribuir parte do apurado diário para com os pobres, e a Dona Sancha de Melo Barbosa, que vem atrás do marido, queixando-se de seu excesso de caridade, só se acalma quando ouve as explicações do doutor: — Não reclame, minha querida, o que é nosso ficou em casa! A nossa ventura é proporcional à felicidade que fizermos os outros. Quem planta colhe, Sancha! E voltavam abraçados, para se sentarem nas cadeiras de balanço, debaixo de um frondoso tamarinheiro de uma florida alameda.
No final do livro o Dr. Luiz nos aconselha: - O espiritismo também acha que nenhum povo deve entregar mansamente sua cabeça ao cutelo, mas deve respeitar, acima de tudo, a moral e os mandamentos do Evangelho, a suprema lei de Deus.
Há uma passagem bíblica que diz: “Aos filhos dos filhos, o homem de bem sempre deixa uma herança.” Às vezes, esta herança de sabedoria, como transmissão de habilidade ou legando de espiritualidade, vem embutida no DNA e nas fibras morais da alma.  Na mesma Rua Dr. João Tomé, em que o Dr. Luiz distribuía o apurado do dia com o povo, um trineto, o menino Pitágoras Feitosa Teixeira, acorda assustado numa sonolenta hora da madrugada. Dormia na casa de seu Padrinho. Bate na porta do quarto do mesmo e dá um recado:
- Padrinho, o seu tio, aquele que mora na Praia das Fontes, mandou-lhe dizer que você não abandone seus primos!
O padrinho em reflexiva surpresa, indaga:
- Mas Pitágoras, como ele mandou esse recado, se você esteve dormindo aqui em casa, e o meu tio já é falecido?!  Mas, de imediato, compreende e mais que depressa procura levar ajuda ao distantes primos, executando a preciosa regra que resume todas as questões ético-morais da humanidade, a lei do Karma, ensinada há mais de 2000 anos por Jesus Cristo: - A cada um segundo as suas obras!

Raimundo Cândido 

Júnior Bonfim disse...
Parabéns, Raimundinho, pela belíssima Crônica que mergulha nas águas serenas do batismo espiritual.
José Alberto de Souza disse...
Impressionante sua capacidade de transmitir conhecimento. Dos seus escritos me chegam luzes de sabedoria que procuro assimilar da melhor maneira possível.