terça-feira, 22 de janeiro de 2013


DONA GENA

Segurei em suas mãos
E, agora, andando a passos lentos,
Desacelerei meu coração
E valorizei aquele belo momento.

A minha avó completara noventa anos de idade;
Na missa, o Padre lhe prestou uma homenagem,
Todos lhe aplaudiram com felicidade,
Mas não sabiam contar a história desta longa viagem.

Primeira parada, em cima da Serra,
Na Arara dos Rodrigues, como era chamada,
O lugar que seus pais lhe receberam na Terra,
Como a décima primeira filha tão amada.

A família convivia com alegria e respeito,
Uma infância de brincadeiras; juventude de responsabilidade,
As chamas do saber já iluminavam seu peito,
Como uma ânsia de suprir sua curiosidade.

Logo, seu pai contratara um professor
Para lecionar aos filhos por sessenta dias,
Aquele curto tempo para ela teve o valor
De levar para posteridade sua latente sabedoria.

Queimando pestanas, à luz de lamparina,
Junto com as palavras já não queria dormir,
Encontrou, no aprendizado, a esperança da menina
Superar obstáculos e conseguir evoluir.

O tempo passara e os olhos castanhos da bela mulher
Era cortejado em toda a redondeza,
Mas ela sabia o que seu coração quer
E guardou para seu amor, toda sua beleza.

O encontro com o José de Melo Ribeiro
Em uma festa de agosto no Assis,
Mudara seu destino por inteiro,
Nascera dali uma união feliz.

O companheirismo de sessenta e um anos de casamento,
Uma vida de trabalho para criar os descendentes,
Sete filhos que guardam no pensamento
A honra de terem sido educados por um casal descente.

Àquelas lições do professor contratado
E a compreensão do seu companheiro, acredite!
Fizeram com que os sete filhos fossem matriculados
Na inesquecível escola da Dona Delite.

E, dali, os passos largos da educação
Impulsionaram esta família para o futuro profissional,
A atitude desta mulher de visão,
Faz com que os netos lhe agradeçam em especial.

Voltemos, ao casal, que era referência no distrito e na região,
Com portas abertas, a casa era dos amigos;
No comércio, o crédito para quem não tinha um tostão;
Na cozinha, um prato para matar o pior inimigo.

A fome que assombrava o nordestino;
Na casa Rodrigues Melo, conheceu a solidariedade,
Comida, no prato, não se deixa menino!
Tem outros irmãos nosso, esperando esta caridade.

Ainda recordo dos meus amigos do interior,
Sendo alimentados pela minha avó,
“Tigena”, como é bonita a prática do amor,
Pois a teoria não produz efeito só.

Mas naqueles tempos, a vida também era divertida
E, na bodega do Sr. “Zé Padre”, sempre à frente do balcão,
Tinha muita gente reunida
Na gargalhada, sem confusão.

A Vovó comandava a brincadeira
Sinuca, baralho e muita prosa engraçada,
Vinham pessoas da região inteira
E ficavam sentados até na calçada.

Fazia picolés de saco para os pequenos,
Ainda sinto o gosto do Q’Suco e da coalhada
E o vovô com seu olhar sereno,
Reprovando a turma da cerveja gelada.

Às quatro e meia, ainda no escurinho,
A erva doce exalava seu cheiro nunca esquecido,
Era Dona Eugênia, preparando com carinho,
O chá de despedida de seu marido.

Que partia para cidade de Crateús,
No seu ônibus, que interligava às difíceis estradas,
Naquelas casas, ainda não tinha chegado a luz
E os seus faróis iluminavam aquelas jornadas.

Há dois anos, na parada de uma estação,
Descera seu maior companheiro de viagem,
Mas permanecera em seu coração
O brilho que deixou em sua passagem.

Hoje, que o trem fez estada na casa dos filhos,
Vivencia o progresso que iniciou com sua lição;
Sente-se orgulhosa de nunca ter saído dos trilhos
E do sangue dos Rodrigues pulsar em seu coração.

Nascimentos, casamentos, formaturas, aprovações a comemorar
Em mais de trinta e um mil dias, ofertados pelo Senhor,
Honestidade, união, alegria a desfrutar,
Colheitas de uma plantação de amor.

(Na data de hoje, 22 de janeiro de 2013, a Vovó completou 91 anos de idade para alegria de toda a família. Felicidades e Muita Saúde!).

                                                                                            Silvia Melo.

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