quarta-feira, 3 de agosto de 2011



O Homem na minha cama

vou te dar um abraço nu
em pêlo e suor
e me encaixar
feito pecinha de quebra-cabeça
em teu corpo
vou te dar beijos vestidos
em língua e salivas
onde possa saciar
a sede que me consome
vou te dar minha pele
perfumada em gozo
quando deitares na minha cama

Karla Gomes

terça-feira, 2 de agosto de 2011

JOSÉ PEREIRA DE SOUSA


O que é esse caldeirão permanentemente fervilhante que chamamos mente humana? Como conceituar essa perseguida lâmpada que se convencionou avocar como razão? O que vem a ser esse paradoxal fenômeno que denominamos loucura?

Machado de Assis, no remoto ano de 1882, escreveu um livro - ou conto ou fábula ou novela, porém obra-prima – em que desenha, com o pincel da sua genial ironia, uma caricatura dos valores de sua época.

Subjacente à história de Simão Bacamarte, um médico formado em Portugal que se instala em uma pequena cidade do Rio de Janeiro (Itajaí), ele promove uma viagem fascinante pelos espaços mais íntimos do ser humano. Desliza pelos bueiros mais profundos do raciocínio, senta o cajado da reflexão no terreiro do pensamento e produz um binóculo especial para mirar a nossa argila mental. Discorda da visão majoritária da época, que considera as posturas divergentes da média predominante como desvirtuamento dos sentidos ou descontrole da imaginação.  Conclui que, não raro, rotulamos superficialmente de loucura aquilo que, em verdade, é a mais profunda expressão de lucidez.

Crateús sempre foi uma cidade prodigalizada com a presença, em suas largas e generosas ruas, de pessoas alheias ao figurino convencional de modelo comportamental. José Pereira de Sousa, o Pereirinha, é uma delas. Bonachão, corpulento, solitário e solidário, imune ao ódio, ansioso por um sorriso, avesso a maldades, discípulo da bondade.

Conheci-o, na década de 1970, no comércio do meu pai. Eu era um menino e ele, vendedor da Casa Beija-Flor. Depois nos reencontramos, ao final da década de 1980, quando ele retornou do Rio de Janeiro, onde passou uma temporada trabalhando no famoso hotel Glória. Voltara fascinado com a liderança carismática de Leonel Brizola, cuja mão havia apertado em uma praça carioca.


O final dos anos oitenta e início dos anos noventa sacudiram Crateús. Uma brisa de esperança bafejava a cidade, que exalava um charme mudancista. Um grupo de jovens políticos ascendia ao poder municipal. Pereira estava próximo dessa turma. Logo, abriu-se uma dissidência e, nas eleições de 1990, do grupo emergiram dois candidatos a deputado estadual: Manoel Veras e Sérgio Morais. Amigo dos dois, Pereira vivia a desconfortável situação de ter que se equilibrar entre ambos sem que isso causasse constrangimentos. Idealizou uma solução para o caso: no bolso direito andava com o retrato (“santinho”) de um e no esquerdo o do outro. Quando se aproximava de aliados de um ou do outro, sacava a foto que faria a festa dos militantes. É óbvio que todos sabiam da estratégia... Um belo dia, Pereira adentra na barbearia do senhor João Freire e lá encontra Sérgio Moraes. Este lhe indaga: - Pereirinha, você está comigo mesmo?  Assustado, Pereira responde: - Claro, meu chefe, estou com você. Tanto é que carrego sempre o seu santinho no meu bolso. E, nervoso, erra o bolso e exibe a foto de Manoel Veras...

Tempos depois, selecionado em concurso público, foi efetivado nos quadros da municipalidade. Lotado no Gabinete do Prefeito durante a gestão de Paulo Nazareno, andou o município inteiro e protagonizou vários episódios que enfeitam o folclore político local. Nazareno fez fama como Prefeito de atitudes inesperadas, amigo das minorias discriminadas. Quando da inauguração do CAPS (Centro de Apoio Psicossocial), Paulo fazia um discurso emocionado narrando que aquele espaço seria um lar para pessoas muito inteligentes, dotadas de grande sensibilidade e que, no entanto, a sociedade marginalizava, classificando-as como “loucos”... Pereirinha interrompe: - como eu, doutor Paulo?!!!  A gargalhada foi geral.

Pereirinha é um ser prestativo, com enorme disposição para servir. Mora sozinho em uma casa no bairro São José, o santo do seu nome. Tem uma legião de amigos. Esconde a idade. Parece usar isso como escudo para proteger a tenra infância que vive bailando diariamente em sua alma. É, de fato, um menino. Menino que leciona aos adultos que é possível se viver de bem com os outros, de modo desprendido, aberto às novidades, sem cultivar rancores de qualquer espécie, liberto dos preconceitos tolos da política, expondo na janela da convivência as samambaias da leveza e da alegria. Alguns podem até considerar louco quem assim se comporta. Olvidamos de reconhecer, na masmorra da ganância e na escuridão do nosso egoísmo, que essas pessoas são, como ensinou Machado de Assis, verdadeiros vaga-lumes da lucidez.   


(Por Júnior Bonfim, na Revista GENTE DE AÇÃO)














 
 

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Inocência

Ainda menina
Com os cabelos cacheados e bem alvinha
Descalça e de calçola,
Percorria rua abaixo e rua acima

Lá no meu interior, onde tudo
Parecia-me grandioso
E até Dom Fragoso,
Homem sério e bondoso
Fizera-me acreditar
Quando seu sermão ia escutar
Que o bom da vida é sempre perdoar

O tempo passou
E tudo por lá mudou
Há que saudade dessa época
E da menina sapeca
Que por Crateús se apaixonou

De regresso à minha cidade
Revivo a ingenuidade
De tudo o que na infância acreditei
E com maior encanto, sonhei

Oh, Crateús, tão bela
Aos olhos daquela infante
E pra essa época
Que parece distante
Já não és tão grandiosa
Mas, continuas a majestosa
"Princesa do Oeste".

Cheyla Mota

Raimundo Candido disse:
Ainda verei, com esses pobres e tristes olhos que a terra tão cedo não abocanhará, uma revolução! Alias, já se conflagrou vivamente aqui na ALC, com nosso quinteto valente formado por Vera, Nega, Silvia, Ísis e Adriana. E ainda chega um reforço para a tropa da mulherada, aumentando ainda mais seu poder de fogo, com as poetisas Cheyla, Karla e Ana! ( Confesso baixinho, para que ninguém nos ouça: Essa nova estratagema  literariamente ortogonal  será a nossa santa Salvação!)
Práxedes , o  Brega!
            Existem duas sentenças proferidas pelo jamaicano Bob Marley que são refutações a estas colisões de desigualdade que paira nos dias de hoje e que a todo custo se tenta abafar. Uma diz: “Vocês riem de mim por eu ser diferente, e eu rio de vocês por serem todos iguais”. A diferença era só a espiritualidade de um gênio que pairava acima de nossa medíocre normalidade. Mas há outra sentença que insisto em mencionar por ser uma grande preleção filosófica de vida, deste uirapuru da fauna musical, pois, quando cantava, nossas almas se afinavam na harmonia que efervescia o nosso sangue e nos dizia: "Não viva para que a sua presença seja notada, mas para que a sua falta seja sentida..." Grande Bob! Pressinto que Deus está se alumbrando com aquele seus batuques rítmicos...
            Já que falo em genialidade, lembro-me agora de Raul Seixas, que proferiu este verso do alto de sua despreocupada irreverência: Eu vou descascando a minha vida,/ Sujando a avenida/ Com meu sangue de limão. Raul repetiu mais de uma vez, como um grande normal fora da lei que sempre foi, que adorava literatura mas odiava os doutrinamentos das escolas. Diga-me se isso pode ser?
            Relembro mais um destes seres exótico, antes de chegarmos lá, onde teremos que ir. É um ícone que representa a praia de Iracema, em Fortaleza. O cantor brega e comediante Falcão, com seu finíssimo humor por trás dos óculos escuro num abafado terno floreado, com aquela patriótica gravata verde e amarela distribuindo seu sorriso autêntico e afirmando que toda besteira é a base das sabedorias! Anda pelo calçadão da beira-mar, dançando e cantando, simpaticamente com sua elegante cafonice. 
            Temos também por estas plagas um breguíssimo e eminente personagem que já faz parte do rol cultural dos nossos notáveis cidadões crateuenses.
            Desfila pelas nossas ruas em seu carro com um alarme especial que emite a sirene do corpo de bombeiros, da polícia ou o bramido de um raivoso touro. Quando passa por uma bela jovem, sua buzina soa num acústico veludoso como se alisasse todo o corpo da donzela que inconscientemente encara o motorista com seu poético bigode de Paulo Leminski.
            Práxeres, com x e um acento no a, como faz questão de explicar, e diz que se não for assim é falso! Raimundo Práxedes de Azevedo já passou por tudo nesta vida. Ele brincava com seus alunos ( Está afastado das salas de aulas depois de 30 anos de lições cativantes e cheias de momentos excêntricos que prendiam a atenção de seus discípulos!) perguntando: Qual o professor que derrubou uma parede de dois tijolos, e só com a cabeça?  Ele mesmo! E numa moto com o filho na garupa, por Deus estão os dois, filho e pai vivos, para contar a historia.
            No seu programa radiofônico, um brega puro e cheio de paixões não correspondidas, aos domingos das 11 horas ao meio dia, a recepção é de Crateús até Brasília, devido a globalizante Internet. Tem muita audiência, diz. Às vezes é o Dr. Paulo Nazareno que mete a cabeça na porta : Ei, rapaz, está cidade é uma selva sem você! E já pede uma música. Com a convicção de seu sucesso , brinca ironicamente com a concorrência: Não me acompanhe que não sou novela! Tem dor de cotovelo em alta voltagem e abundante música chorosa para aliviar a aflição de todos os tipos de cornudos. De Alípio Martins a Lindomar Castilho, o homem que matou sua mulher por amor.  E continua explicando: brega hoje é qualidade, é romantismo. Dentro do seu programa há uma parte cultural em que lança frases proverbiais do tipo:
Sogra, milho e feijão, só debaixo do chão! Com isso sua digníssima esposa andou lhe puxando as grandes orelhas e a frase assim ficou: Sogra, milho e feijão, só debaixo do chão, mas adoro a sogra da minha mulher! Práxedes é assim, irreverente e espirituoso e pelo microfone, em pleno ar tremeluzente das ondas radiofônicas, se sai com essa : Mulher de amigo meu é igual a muro alto, é perigoso, mas eu trepo! Tudo fazendo parte de uma breguiçe de qualidade.
            Folclórico, um patrimônio cultural de nossa cidade, quando vai chegando o mês de dezembro coloca logo sua diária mensagem natalina, repetida nos altos falantes do cimo portes no centro da cidade. Já é habitual e o povo fica aguardando, na expectativa. Certa feita, ele desejou um Bom Natal e um Feliz Ano Novo pelas 38432 gotas de sangue que Jesus derramou na cruz por todos nós! Estava desencadeada uma grande polêmica. Mandaram chamar Práxedes, no programa de Irismar França, que disse: Tem um pastor aí criticando esse negócio das 38432 gotas de sangue. O que você me diz? E Práxedes retrucou: Irismar, eu num sou tartufo não, que usa um parágrafo da Bíblia para poder sair construindo por ai umas quatro paredes para fazer  comércio. Chame esse pastor para um debate, aqui! Eu só falo a verdade e tenho provas.  E assim fez Irismar, mas o Pastor respondeu: - Rapaz, sinceramente eu tenho minhas dúvidas, mas eu não quero conversar com esse homem não!
            Agora mesmo podemos encontrar o breguíssimo Práxedes numa mesa de bar, por qualquer esquina de nossa cidade, ouvindo suas melodiosas musicas bregas em alto e bom som. Entre elas, impõe sua veludosa voz de locutor com um dito picante, de dúbio sentido e que, mais a frente, uma ruborizada e pudorosa senhora se queixará: - Oh bicho imoral!
            Passa por minha mente outro Sui Generis poeta, o acelerado Paulo Leminski, que nos faz lembrar nosso amigo Práxedes, ambos livres das amarras do mundo, com suas almas leves ruflando com seus alados bigodes negros, e pronunciando seus emblemáticos lemas: O pauloleminski e o Práxedes / são dois cachorros loucos / que devem ser mortos / a pau e pedra / a fogo a pique / senão são bem capazes / os filhosdaputa / de fazer chover / em nosso piquenique.
Raimudo Candido


José Alberto de Souza disse...


Excelente crônica que resgata tipos populares ai de Crateus, universalizando um rico cotidiano cearense. Só mesmo poderia ser criada por esta pena brilhante do amigo "Bodegueiro".
Quinta-feira, 04 Agosto, 2011

domingo, 31 de julho de 2011

POSSE DE NOVOS ACADÊMICOS NA ACADEMIA DE LETRAS DE CRATEÚS - ALC

DISCURSO DE SAUDAÇÃO AOS NOVOS ACADÊMICOS DA ALC

Autoridades que compõem a mesa,
Senhoras e Senhores,


Meu cordial Boa Noite!

Contam que, seis séculos antes de Cristo, lá pelas montanhas do Oriente, onde tudo nasceu, viveu um ser fulgurante chamado Lao-Tsé.  Lao significa "criança, jovem, adolescente". Tsé é o fluxo de muitos nomes chineses, que quer dizer "idoso, maduro, sábio”. Lao-Tsé, o "jovem sábio", o 'adolescente maduro", foi contemporâneo de Kung Fu Tsé, o Confúcio, de quem foi discípulo. Era guardião dos arquivos do Tribunal Imperial Chinês e atraiu muitos seguidores com sua sabedoria, embora sempre haja se recusado a fixar suas idéias por escrito, por temer que as palavras pudessem cair na vala comum do formalismo dogmático.

Octogenário e desiludido com as pessoas da sua terra - que estavam pouco dispostas a seguirem o caminho da bondade natural - rumou para o Tibet, na fronteira ocidental de China, quando foi reconhecido por um guarda. Este lhe lembrou que possivelmente todos os seus ensinamentos logo migrariam para o esquecimento se alguma coisa não ficasse gravada, e só permitiu que ele deixasse a China após escrever seus ensinamentos básicos, a fim de que pelo menos parte de seu conhecimento pudesse ser preservada para a posteridade. Atendendo ao pedido do guarda, de uma só vez Lao Tsé redigiu (reza a lenda que escreveu numa grande pedra) a coletânea dos 81 versos que se tornariam a síntese de sua sabedoria, que entrou para a história sob o nome de Tao Te Ching (O Livro que revela Deus) e é, ao lado da obra de Krishina e de Jesus, uma das três mais importantes mensagens da humanidade. Diz ele no segundo poema:

 “O fácil e o difícil se completam.
O grande e o pequeno são complementares.
O alto e o baixo formam um todo.
O som e o silêncio formam a harmonia.
O passado e o futuro geram o tempo”.

Segundo Huberto Rohden, Lao-Tsé nos ensinou a grande lei da bipolaridade do Universo e de todas as coisas. Nada é somente o Uno, e nada é somente o Verso - tudo é Universo, unidade na diversidade, equilíbrio dinâmico, harmonia cósmica.

Modestamente opino, senhor Presidente, que o sucesso da nossa Academia, grêmio literário em plena maturidade juvenil, repousa no fato de ser uma peça de renda única tecida com os fios coloridos do algodão da diversidade. Seu piso é um tablado constituído de mosaicos distintos. A poesia popular, filete natural, fonte cristalina, representada dentre outros por Lucas Evangelista e Dideus Sales, caminha de mãos dadas com a mais apurada erudição de um Padre Geraldinho, por exemplo.  Embora com pouco mais dois anos de idade, seus passos firmes já se fazem sentir em todos os quadrantes da nossa urbe. Já temos um sítio na internet (www.academiadeletrasdecrateus.blogspot.com) que, aliás, é extremamente prestigiado. A nossa roça de escrituras já exibe mais de dez obras publicadas no espaço de apenas dois anos, algo nunca ocorrido em nossa cidade.  Alguns dos nossos integrantes foram premiados em certames estaduais e até nacionais. A participação nos mais diversos eventos culturais da cidade é outro diferencial.

Pois bem, é nessa esteira que hoje, noite estrelada e memorável, abrimos os portões invisíveis das nossas almas, cedendo aos movimentos de lustre dos nossos corações, para fazer luz aos neófitos que serão iniciados em nossa oficina de prosa e verso.

E, como bons cavalheiros, todos de chapéu na mão, nos perfilemos para receber primeiro as damas.

Tiro o chapéu inicialmente para Ana Cristina do Vale Gomes. Ela já devia estar aqui desde a fundação. Não faltou quem estranhasse. Sua ausência foi sentida. Houve até o petardo da censura: - a Ana não faz parte da Academia? Esclareço: ela foi uma das primeiras convidadas. Razões de foro íntimo a impediram de se banhar nas nossas primeiras águas batismais. Hoje ela o faz. Escritora com doze livros publicados, sacerdotisa da pedagogia, insufladora da flora educacional, empresária do setor livreiro, chega em nosso círculo com suas dinâmicas de grupo, com seu repertório de idéias criativas, juntando os pedaços das palavras para bradar, da cadeira do vulcânico poeta Paulo Leminski, que sua profissão de febre é a literatura.   


Como poderei verbalizar para os presentes a doce leveza, o suave encantamento da dona Cheyla Mota? Recordo-me dela, garota delicada, morando no entorno da nossa Catedral e embriagando de sorriso e paciência as tardes da praça da matriz. Dos bancos das nossas escolas tradicionais – Lourenço Filho, Pio XII, Escola de Comércio – foi tomar assento nas faculdades da Capital e lá se fez Pedagoga, Psicopedagoga e, com louvor, escritora. É articulista da nossa Gazeta do Centro Oeste. Autora do romance A Saga de Will. Sobre Cheyla, bem conceituou a doutora em filosofia Silvia Leão: “Quem diria...Tímida, reservada, em esforço constante de não aparição! Esforço inútil, pois a beleza dela resplandece naturalmente, Da aparência à essência, a beleza dela resplandece”. Alma generosa, foi arrastada por essa misteriosa força de afinidade arrebatadora chamada amor e, ao lado do consorte Isaac Furtado, experimenta o mel da cana-de-açúcar que se ergue no solo fértil do progresso literário.

A terceira dama que engalana a nossa festa é Karla Gomes. Todos a conhecem por seus dotes cênicos, pela elegância dos seus gestos, flor entre cristais, caminhando como quem desfila. Todos batem palmas para sua desenvoltura como atriz, diretora e produtora. Todos admiram sua dedicação militante à cultura da nossa terra, como co-fundadora da Companhia de Teatro Os Cara da Arte e presidente da Sociedade Amigos da Biblioteca Municipal Norberto Ferreira Filho. Hoje trazemos à ribalta sua Certidão Poética e divulgamos seu parentesco lírico. Faço minha a trova do confrade Raimundo Cândido:

Por onde te escondias, poetisa?
O tempo passava e a gente te via
por ai, toda arte e prosa, toda rosa,
mas nada do que agora mostras: poesia!!!

Aplaudamos a pedagoga e poetisa Antonia Karla Bezerra Gomes.

Saudemos agora os cavalheiros. Começo por um que foi meu contemporâneo de adolescência: José Rodrigues Neto. Era um cabra meio envolto em si mesmo, tipo cientista, absorto no próprio mundo, como se vivesse a calcular e esquadrinhar a raiz de tudo. Depois descobrimos a razão da sua introspecção. Graduou-se em Ciências. Virou matemático. Psicopedagogo. Professor da Universidade Estadual Vale do Acaraú-UVA. Brinca com os sólidos geométricos. Transforma em poesia os teoremas mais complexos.  É um laboratório fantástico de cordéis e livros didáticos sobre matemática para jovens e adultos. Cria coleções de cartões postais para massificar o aprendizado dos Números. Afinal, como Pitágoras, descobriu que tudo são números. E que “A Evolução é a Lei da Vida, o Número é a Lei do Universo, a Unidade é a Lei de Deus”. Foi Pitágoras o primeiro filósofo a criar uma definição que quantificava o objetivo final do Direito: a Justiça. É sua a definição de que um ato justo seria a chamada "justiça aritmética", na qual cada indivíduo deveria receber uma punição ou ganho quantitativamente igual ao ato cometido. Por isso me pediram, meu caro Neto, para ler em voz alta o seu veredicto: Foi o senhor José Rodrigues Neto condenado a assumir um lugar entre nós e sua pena será a prestação de serviços à nossa unidade benfazeja, através do esquadro do pentagrama, das veredas da álgebra, das trilhas geométricas, calculando as operações corretas para chegarmos à felicidade. Cumpra-se!

"Nunca estamos vivendo à altura das nossas possibilidades." Esta frase parece se constituir o resumo biográfico de João Silas Falcão Soares, o Silas Falcão. Confesso a vocês a minha estupefação quando, há algum tempo, encontrei em Fortaleza o escritor Silas Falcão. Jamais imaginei que por detrás daquele sujeito aparentemente arredio se escondia um verdadeiro monstro da criatividade lingüística, capaz de se envolver nos mais empolgantes vôos gregários e participar de antologias com nomes sugestivos como Abraço Literário e Papo Literário. Cursou Administração de Empresa, mas se especializou em administrar empreendimentos literários. Pertence à Associação Cearense de Escritores, onde ocupa o cargo de Diretor de Eventos. Criou a marca Você Moda Cultural, camisaria especializada na divulgação de imagens motivacionais e textos da literatura Cearense. Ano passado foi homenageado com o Diploma Mérito Cultural pela ALMECE - Academia de Letras do Município do Estado do Ceará.  O autor de “Por que Somos?” e “A Prisão de Deus” é um ser encarcerado. Ele próprio revela sua rotina depois que conheceu o livro: “nunca mais me retirei da bondade da leitura, que me jogou dentro da literatura onde encontrei Pasárgada, a civilização imaginada, criada pelas palavras”. Silas, nosso Falcão peregrino, a mais veloz ave do mundo e do reino animal, abre tuas asas e exibe tua condição de cativo à formosa deusa Liberdade. Tua tarefa será a condução deste Sodalício à relembrança permanente de que ninguém é pobre quando ama e que devemos sonhar com flores brotando em pleno asfalto. Salve, Silas!


Em louvor ao centenário da nossa cidade, anuncio que é de uma estirpe centenária o outro varão que vem fortalecer nossas colunas: José Maria Bonfim de Morais. Filho do Felipe CEM, o sobrinho da Rosa que deu nome a este Teatro se especializou nas matérias que versam sobre o lado esquerdo do peito e fez fama em Fortaleza. Granjeou também conceito internacional. Além da intensa atividade profissional, é militante filantrópico e integrante, dentre outras, da Associação Cearense de Escritores (ACE) e da Sociedade Brasileira de Médicos Escritores (SOBRAMES). É articulista festejado do Diário do Nordeste. (Gerardo Mello Mourão contava que seu amigo Austregésilo de Athayde, chegado de Paris, onde pronunciara um discurso histórico na Assembléia Geral da ONU, foi ao Recife, para contar a história à sua mãe. Certo de que o episódio a encheria de orgulho, ao saber do filho aplaudido por todas as nações da terra, na tribuna mais alta do planeta, o que ouviu foi quase um muxoxo de desdém: "É — respondeu-lhe a velha mãe nordestina — mas você nunca discursou no Teatro Santa Isabel". O Teatro Santa Isabel era o palco maior, o símbolo conspícuo, das grandezas e da glória regional de sua honra pernambucana. Falar ali, na tribuna egrégia em que ressoaram as vozes de Joaquim Nabuco de Castro Alves e de Tobias Barreto, as vozes de sua raça e de sua tribo, de sua história e de suas raízes, isto sim, é que era a coroa de louros e a taça de ouro de uma carreira olímpica. O laurel imarcessível com que o "vir gloriosus" podia destruir o provérbio pessimista de que ninguém é profeta em sua terra). Conhecedor da habilidade de José Maria na edificação das palavras e das suas incursões pelas mágicas grutas da poesia, lancei-lhe convite para tomar assento nesta Arcádia. Imaginei que, mercê do destaque que conquistou e das inúmeras atribuições, declinaria habilidosamente da incitação. Sua resposta me surpreendeu: - Sentir-me-ia muito mais honrado em participar da Academia de Letras da minha terra do que da Academia Brasileira de Letras. A honra é recíproca, mestre José Maria. Sei que, no palco maior da vossa terra, tomas assento na Academia de Letras da tua tribo com um orgulho especial. Por isso assuma a regência da orquestra dos nossos corações. 


A minha convivência com o recipiendário que agora apresento se iniciou no oceano da política e terminou por nos aproximar nas outras praias da vida. Conheci o ser sensível e profundo, endoscopista de almas, amante da natureza, aviador natural, apreciador da boa música, estudioso dos grandes temas, visionário trabalhador. Jamais consegue ser morno. É sempre gelo ou brasa. Adora viver perigosamente, escalar as montanhas dos desafios, palmilhar as trilhas adversas. Saboreia intensamente cada prato que o restaurante da vida lhe oferece. No entanto, ao longo da nossa convivência, tive a oportunidade de identificar a mais original das suas facetas: no lençol freático desse homem aparentemente duro, há um poço profundo de ternura. Falo de Paulo, o Nazareno. O sério careca de hoje já foi o cabeludo irreverente, tipo hippie, que amava os Beatles e o Rolling Stones. Escreve. A letra é feia, mas o conteúdo é bonito. É poeta. Está com dois livros no forno: um sobre o rio e a vida e outro sobre o papel da mulher nas nossas vidas. Vista sua roupa branca e entre, Paulo. Um conselho, apenas: Assopre as velas da comemoração. Apague o que ficou para trás. Mire o futuro e reparta o bolo da amizade. Aqui o banquete é de fraternidade. Seja bem-vindo, Paulo Nazareno Soares Rosa.


Penso que falta a este Teatro a presença dos sinos. Sinos, senhoras! Senhores, faltam sinos neste templo ecumênico da cultura crateuense. Como é lindo o repicar dos sinos anunciando e ao mesmo tempo convocando a todos para, com formalidade litúrgica, participarem da solenidade essencial. E se alguém nos perguntasse: ?por quem os sinos dobram? Diríamos que dobram por Juarez Leitão, o maior poeta vivo dentre os nascidos neste sertão. Sim, porque todos nos postamos, reverentes, ante o brado retumbante da sua verve, fazemos um semicírculo cerimonioso sob o barulho tonitruante dos tambores da sua oratória. Oratória que o tornou laureado na Academia Cearense de Letras, na Academia Cearense de Retórica, na Academia Fortalezense de Letras, na Academia de Artes e Letras do Nordeste, na União Brasileira de Escritores e na Associação Nacional dos Professores de História. É difícil precisar se fala melhor do que escreve ou se escreve melhor do que fala. Resplandece como historiador, poeta, cronista, biógrafo e conferencista. Juarez, teu caule é alimentado pela seiva do nosso Juá. E é como um colossal pé de Juazeiro, a palmeira do nosso sertão, que o teu nome eleva a nossa instituição, mantendo-a permanentemente viva e verde.


Se nada tivesse produzido, esta Academia já se justificaria apenas por uma dos ensinamentos que nos legou. O de que é possível obedecermos à lei do universo que nos ensinou Lao-Tsé: as diferenças não constituem obstáculo à convivência respeitosa entre diferentes, à harmonia entre os contrários, ao louvor à pluralidade. 

Viva a Academia de Letras de Crateús!


(Discurso proferido por Júnior Bonfim na noite de 30.07.2011 por ocasião da posse dos novos membros da Academia de Letras de Crateús – ALC – no Teatro Rosa Morais, Crateús, Ceará)


Sergio Moraes disse...


Caro Junior,

cumprimento-o pelo belo discurso de saudação aos novos acadêmicos da ALC. Nesta oportunidade, parabenizo os novos empossados augurando-lhes votos de mais sucesso e realizações.

Abraços



1 de agosto de 2011 09:53




ACADEMIA DE LETRAS GANHA INTEGRANTES

Em apenas dois anos de atuação, a Academia de Letras de Crateús
comemora seus novos membros e projetos

Em solenidade realizada ontem à noite no Teatro Rosa Moraes, a Academia de Letras de Crateús (ALC) empossou e diplomou mais oito novos membros, eleitos em assembleia, em junho. Ana Cristina do Vale Gomes, Karla Gomes, Cheila Mota, Silas Falcão, Juarez Leitão, José Maria Bonfim, Paulo Nazareno Soares e José Rodrigues Neto agora fazem parte do seleto grupo de intelectuais deste Município.
Em pouco mais de dois anos, a Academia passa de 22 membros fundadores para 30, estando agora bem próximo da sua composição: 40 membros efetivos. Além desses, o seu estatuto prevê também membros correspondentes e membros honorários. Tem como finalidade propagar a cultura e a literatura na esfera erudita e popular no Município e região. Para cada uma das 40 cadeiras, os ocupantes escolhem os respectivos patronos, homenageando personalidades que marcaram as letras e a cultura brasileira. As reuniões ocorrem bimestralmente na sede da instituição.
A nova leva de acadêmicos anima a diretoria da arcádia. "Essas novas pessoas que estão chegando são todas experimentadas, boa parte possui livros publicados e nos levam a acreditar em um futuro promissor para a Academia. Acolhemos a todos com alegria", destaca Elias de França, presidente da ALC. Ele enfatiza a pluralidade do grupo originário e dos novos. "Temos poetas, cordelistas, jornalistas, contistas, enfim, um grupo bem plural e isso acaba impondo um desafio e ao mesmo tempo uma grande riqueza, advinda dessa diversidade".

Instalação
A ALC foi instalada, oficialmente, em 13 de junho de 2009 em cerimônia também no Teatro Rosa Moraes, por um grupo de amantes das letras vinculados ao Município. Antes, porém, houve várias reuniões preparatórias permeadas por discussões sobre os objetivos e atuação da instituição. Segundo França, uma delas girou em torno do papel da ALC e composição. "Queríamos reunir e unir pessoas que escrevem e que de alguma forma incentivam as atividades de leitura e escrita. A atividade de escrever é muito solitária, mas refletimos que o fato de nos reunirmos motivaria a partilha e até a publicação de nossos trabalhos", lembra.
Ao avaliar esses dois anos de atuação da instituição, ele diz que esse pensamento tornou-se realidade. "Apesar de termos voltado nossas ações para a parte burocrática da ALC, bem como obtenção de uma sede, o que consome um pouco os nossos esforços, comemoramos a publicação de mais de dez livros nesse período", relata.
Para ele, o livro é a grande testemunha da história. "O que somos devemos aos livros, que desde o tempo dos pergaminhos registram a nossa história. Sem o livro não seríamos o que somos, não teríamos registros efetivos da nossa história", defende Elias de França.

Comprometimento
Outra preocupação dos fundadores, destacada por França, reside na ação da Academia no Município. Os "imortais" não podem ficar isolados da sociedade. "As palavras ´elite´, ´intelectual´ e ´imortal´ para nós são vazias em si mesmas, o que vale na verdade é a ação. Essas palavras somente têm significado se envolvermos as massas e a cultura do povo do nosso Município, por isso não nos isolamos e nem cultivamos vaidades", revela.
De acordo com ele, essa discussão é perene na ALC. "Não almejamos ser uma instituição que objetive cultivar vaidades, elites e cuja existência se encerre em fornecer títulos", enfatiza. Daí, o crescimento da Academia, que, segundo ele, circula nas esferas escolares e da sociedade com muita frequência. "A Academia se tornou maior do que imaginávamos, hoje recebemos inúmeros convites para eventos na cidade e região e percebemos claramente a lacuna que existia na área da propagação da cultura", destaca.

Centenário
Nos últimos seis meses, a instituição tem dedicado boa parte de seu tempo, discussões e ações envolvida com a programação do centenário de Crateús, que ocorrerá em 15 de novembro. A luta priorizada é no sentido de resgatar a história da cidade. "Temos um déficit histórico antropológico imenso, pertencíamos ao Piauí e depois ao Ceará. Perdemos o contato com as nossas raízes e isso precisa ser resgatado", conta. A instituição prepara o lançamento de um livro que resgata essa história e se desdobra na pesquisa. Um grupo visitou, recentemente, os Municípios de Oeiras e Teresina, no Piauí, em busca de documentos que contem as origens da Vila Príncipe Imperial, primeira denominação de Crateús. A busca, agora, é por parceiros para efetivar o projeto.

MAIS INFORMAÇÕES

ALC - Rua do Instituto Santa Inês, 231 - Centro - Crateús
http://academiadeletrasdecrateus.blogspot.com/
Silvania Claudino
Repórter
DIÁRIO DO NORDESTE 31/07/2011