sexta-feira, 9 de março de 2012


Sonhos

Numa ocasião, já bem remota, um velho bardo começou um poema assim: “Há quem diga que todas as noites são de sonhos”, e de lá para cá se estabeleceu que realmente as noites seriam carregadas de ilusões, repletas de fantasias, tomadas por quimeras que nos intimidam por um negrume medonho, fato que não tem a menor importância, pois o que implica em real valor não são as langorosas inquietações noturnas, e sim os  sonhos que nos conectam a algo invisível e que, certamente, existe entre o céu e Terra.
Há muito nos indagamos sobre alguns sonhos e acabamos apurando outros sonhos bem distintos. Não me reporto àqueles que a gente conduz pela vida afora como uma tartaruga arrastando a carapaça. Esses são os sonhos de Ícaro, que se deixou levar imprudentemente pela sede de liberdade e poder, permitindo que a impiedade solar lhe derretesse as asas, mas isso é assunto para as Ciências Psíquicas. É só observar a parabólica trajetória de alguns conhecidos políticos.
                Refiro-me aos sonhos que até os bebês, ainda no útero, se deleitam ao demonstrar pelo movimento rápido dos olhos numa intuição misteriosa de felicidade e em deleitoso contato materno, fugindo totalmente aos parâmetros do genialíssimo Carl Jung a nos impor que é pela busca de equilíbrio que arrumamos uma compensação. Balelas!
Nem sempre é só recostar a cabeça no felpudo travesseiro para serenamente dormir, precisam-se antes de tudo decantar as vivas inquietações. E no apagar das luzes da loucura do mundo acende-se a luz do eu, permitindo que as aves no fim de tarde pousem, trazendo seus alados sonhos.
 Desde que os poetas estabeleceram as possibilidades das coisas impossíveis, uma aguçada ousadia imbuiu-se, às caladas, no talo dos sonhos aguando o potencial criativo que é de onde brotam as idéias. É como se tivéssemos com uma bola de cristal e nos interrogamos, obtendo como resposta uma leve descarga elétrica do nosso subconsciente.
                Um grande gênio da Química, August Kekulé, uma vez arrancou de um enigmático sonho em que uma cobra abocanhava a própria cauda, a idéia da fórmula estrutural do anel benzênico, liquido inflamável, incolor, de aroma doce e agradável, mas altamente tóxico usado na produção de diversas matérias-primas, provando que dos sonhos despertam-se a imaginação, a fantasia e a própria realidade. 
                Sinto-me, quando estou a sonhar, como um canoeiro a navegar num rio que faz a inter-relação entre o agora, o passado e o futuro inspecionando as profundezas ocultas da minha existência. Como o profeta no oráculo a receber Alexandre, o Grande, Rei da Macedônia antes da invasão de Tiro, o qual sonhara com um lúbrico sátiro dançando na sua frente e a única interpretação possível para adivinho foi “Ele está lhe dizendo: Invada meu Rei, Tiro é vossa!”. Como o jovem Tutmés IV sonhando com o deus Sol a lhe mandar que libertasse a sua imagem, a cruel Esfinge, de uma montanha de areia que há séculos se acumulava sobre ela.
Entretanto, os sonhos que mais me fascinam, por serem arcaicos e poéticos, saltam vivos das páginas da Bíblia, com feições sobrenaturais e proféticas, configurando-se como a verdadeira linguagem do Espírito.
É um esplendido sonho ver os anjos subindo e descendo os degraus uma longa escada unindo o céu e a Terra, incitando a fé do Patriarca Jacó. Sublime também foi o primeiro exame de DNA da história, quando duas mulheres se postaram diante do grande rei Salomão, ambas se dizendo mãe de uma criança e o sábio toma uma firme decisão “Como não conseguem chegar à um acordo, tragam uma espada e partam a criança ao meio, e dêem um pedaço à cada uma.” Numa sabedoria adquerida por sonho e só para governar Israel, Salomão distinguiu o amor a implorar vida, e soube da verdadeira mãe.
Um grande sonhador bíblico e renomado onirólogo chamava-se José, um dia sonhou que o Sol e a Lua e onze estrelas se inclinariam diante dele, este primeiro sonho foi o suficiente para instigar ódio nos irmãos, e começou uma epopéia digna de cinema. Exelente foi a interpretação para o Faraó que sonhara com sete vacas gordas, que foram devoradas por sete vacas magras, e com sete espigas cheias e bonitas que foram comidas por sete espigas secas e feias, num desfecho cirúrgico e comprindo-se o que  disse o profeta Joel: “Derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão visões.”
De um simples grão de areia podemos chegar à complexas constelações pelo simples capricho de um sonho. Das areias, em que os pés humanos traçam o seu destino, os sonhos nos fazem levantar vôo e ruflar a um horizonte distante, e eles mesmos nos trazem de volta, do grão ao Universo, do Universo ao grão.
Sonhei, um dia, sendo arrastado pelas águas turvas do Poti, numa correnteza forte e indiferente ao meu apelo, com suas mãos aquosas a me submergir sem me dar direito de uma despedida na luz do dia... 
Um dia, sonhei levantando a âncora de meu navio e zarpando pelo alto mar percebendo o ínfimo de minha vida conectado a um supremo infinito onde tudo se dilui na luz azulada do firmamento...
Agora mesmo despertei de outro sonho agradável, com uma certeza absoluta que não havia sonhado. Alguém que a pouco partira, voltara para me visitar, ampliando uma dor de saudade e novamente partia, deixando-me somente essa triste e diáfana luz que escorre pelos meus olhos...

Raimundo Candido

Jeoge Portela disse...
Enche-me de alegria quando vejo textos como esse de meu recente mais sincero amigo Raimundo Candido, tenho a esperança que a literatura nunca irá submergir entre esses ilusórios caminhos da falta de leitura e alienação tecnológicas em que estão impregnados nossos jovens. Trocam a boa leitura por jogos mordazes de computadores e vídeo games sem o maior pudor ou excitação. Espero piamente que nossos jovens saiam da inércia que estão e abram um livro.
Francisco Pascoal Pinto disse...
A propósito, Raimundo, acabei de ler Sonhos de Sonhos, do Antonio Tabucci, que considero o mais lusitano dos escritores da Itália. Trata dos derradeiros sonhos de personagens que o autor admira, como Garcia Lorca, Pessoa, Caravaggio, Toulouse-Lautrec etc. Contos curtos bons de se ler. Enviei o livro pra você, ontem, pelo correio.
                                                     

                                                    HETERÔNIMOS

                                                            Deus.

             Silas Falcão

terça-feira, 6 de março de 2012


Sertaneja

Do barro de louça
da beira do rio,
imponderável
é a volúpia,
inquebrantável
é a lida em ardor
que a fé moldou!

Do barro de louça
da beira do rio
emprenhou-se,
cio de carne e pão,
a se tornear, fêmea
plena, expelindo
do útero um sertão!

    Raimundo Candido
 Lourival Veras disse...             
Arrebentou, Raimundo!

segunda-feira, 5 de março de 2012

Descomparações

Não me compares às flores,

por mais que seja bela e perfumada.

Não me chames de uva,

ao me achares madura, doce e saborosa,

ou, por vezes, acre, quando verde.

Tampouco sou abacaxi,

ainda que o tempo me tenha enrugado o corpo.

A valentia, ou a pele macia, não faz de mim tigresa.

Não pretendo ser-te pimenta de odor ou ardor,

por mais que cheire e te esquente.

Não sou tua comida,

mesmo quando me possuis vorazmente.

 Não me tomes por aguardente,

ainda que me aches “um porre”.

Nem coco verde, nem quenga,

nem coroa, nem caça-macacas,

Nem piranha, nem cotovia,

nem galinha, nem gata...  nem nada.

Basta!

Chega de metáforas e bajulações.

Quando me citares dentre os humanos,

não me trates de “homem”.

Eis, pois, que sou, simples e necessariamente,

MULHER.

Elias de França

sexta-feira, 2 de março de 2012




                                                  Invenção das coisas


                          Quando cai na terra, a chuva inventa coisas.



                          Silas Falcão

quinta-feira, 1 de março de 2012

Moto-Táxi

A assombrosa história da humanidade, num fabuloso épico, pode ser dividida em três etapas bem evidentes: o domínio do fogo, a percepção da roda e a invasão das motos-taxis.
                O fogo, como liberação de energia presa na matéria, incluindo aquele que arde sem se ver, foi penoso... Foi muito difícil para a raça humana domá-lo como a um corcel ígneo numa monta a pelo, na força bruta. Uma conquista primordial que nos aliviou de um grunhido na garganta, nos tirando da fase puramente animal e implantando um sorriso enigmático na aparência humana – embora alguns teimem em continuar com suas macaquices por aí – e de sobra ainda gerou uma boa literatura.
A fascinação pelas chamas era tanto que despertou delirantes fantasias, mitos incríveis, perversos deuses e os cinematográficos heróis que se encarnaram de nossas mentes. Isso aconteceu com um jovem andino, lá no mais alto das cordilheiras, que recebeu do filho do sol uma chispa de fogo e a escondeu entre o pó do ouro terrestre para amadurecer e brotar num pé de milho como reluzente vigor e néctar.
                O coitado do Prometeu, um Titã ladrão de fogo, foi quem mais sofreu, e aguentou resignado um interminável infortúnio pelo faminto bico de uma insensível águia a lhe degustar o fígado, diariamente, como um saboroso foie gras, e isso por tentar proteger a iníqua humanidade.   
                 Uma labareda foi o início, mas o bom mesmo foi o achado da roda. Quando um tronco de árvore rolou por uma encosta abaixo e um cidadão boquiaberto – já era um faber erectus no meio dos sapiens – deu o primeiro grito de eureka e sorriu de satisfação em adeus ao atrito de arrasto e do rolo ao disco foi um pulo.
                Um dia desses, vendo os pneus carecas de um velho Del Rey, lembrei-me de uma roda que foi encontrada nas ruínas da cidade de Ur, nas margens do rio Eufrates há 6000 anos, que poderia ter caído da carroça de Abrão, o patriarca dos hebreus, na saída para a inalcançável Canaã, e até que me tiraria do prego. Obriguei-me a ir comprar pneus, acenando para um moto-táxi que por ali ia passando.
                Se acaso o amigo(a) repetisse esse usual gesto, lá na cidade de Pequim, uma geringonça pedalada por um ciclista de olhos retesados pararia ao seu lado e lhe ofereceria uma corrida, pois é a moto-táxi da China, o Reino das Bicicletas e a nova babilônia do planeta, que está a encabeçar uma revolução para uma Nova Ordem Mundial (NOM) e que logo vai arrochar, de vez, a concórdia da humanidade, aguarde!
                As idéias que brotam deste impávido e colosso chão, chamado Brasil, são como um imenso clarão que reluz e vai logo concebendo um 14 Bis, uma Urna Eletrônica, um Coração Artificial, e até uma doce Rapadura. Por aqui, nos Sertões de Crateús, uma brilhante idéia também germinou na mente de dois visionários cidadãos, o Sitônio da Coelce e o Edilson Mourão, funcionário do Banco do Brasil, que imaginaram o sistema de Moto-Taxi, uma brilhante idéia que hoje é difundida por todo o país, facilitando a mobilidade urbana, comprovando assim que a necessidade é a mãe de todas as invenções.
O ponto mais agitado da nossa cidade é um diminuto quarteirão, no início da Rua Santos Dumont, entre o centenário prédio dos Correios e a Sede da Prefeitura, e quem se aproxima percebe um som familiar, repetidas vezes:
– Triiiiiiim! Triiiiiiiiim!  
– Moto-táxi, bom dia!
– Quero uma corrida para a Rua Frei Vidal, número 1500.
– Aguarde um instantinho, moço, a moto já está saindo.
E aquela senhora que já chegou ciscando pressa em desesperado alvoroço:
– Vamos! Depressa, vamos...
O mototaxista da vez, nunca saía sem um objetivo certo para a corrida. Estava cismado, mas naquela situação não tinha muito que pensar, foi. Só no caminho percebeu que era mais uma busca de uma ciumenta esposa por um marido que andava em pândegas. De bar em bar percorreram toda cidade, e nada.
– Siga para a Rua Francisco Mariano! Ordenou a desesperada senhora.
Benzeu-se, mentalmente o coitado, pois pressentiu mais um vexame de um triângulo amoroso. Pararam em frente à Casa de Pedra, entraram, e com os olhos de perscruta reviraram os quatro cantos daquele recinto libertino de amor e só o motoqueiro notou uma figura dissimulada, escapulindo por trás de uma porta. Calado estava, calado continuou, não queria assistir mais a um “quebra barraco” que presenciara outras vezes. Deixou a tristonha senhora em casa, esfriando a raiva, na espera do marido farrista.
Na hora do rush, Crateús vira um caos, um enxame com mais de 350 moto-táxi partem num vai e vem frenético, desesperados em revoada pelas ruas da cidade. Se, nesta hora, for atravessar uma rua, olhe bem para os dois lados ,e mesmo não vindo nada não passe ainda, com certeza vem uma moto-táxi veloz que você não viu. É tanta moto em profusão que aguçou a$ exigência$ da Companhia de Policiamento Rodoviário, CPRV do Governo do Estado, assustando o homem do sertão mais do que o flagelo do cavalo de Átila arrotando feroz calamidade.
                Depois do cruel latrocínio do motoqueiro Filomeno, os profissionais da moto ficaram mais diligentes, mesmo assim todo cuidado é pouco neste arriscado ofício. Uma vez um descuidado motoqueiro acertou uma corrida com o tal de Escadinha, foi uma questão de sorte, alguém viu e saíram no encalço para avisar ao incauto amigo. O meliante, pressentindo a perseguição das outras motos, desceu na altura dos Pastos Bons, mas não deu uma viagem perdida, assaltou, ali mesmo, uma fazenda de uma desprevenida empresaria citadina, fugindo no seu possante carro de passeio.
                A profissão de mototaxista compensa, numa terra de poucas oportunidades. Se tiver com todos os documentos exigidos pelo Sindicato e 15 mil reais para a concessão de uma vaga, é só se ambientar num dos 16 pontos espalhados pela cidade e cumprir uma rígida tabela de preços.
                Li outro dia, uma notícia interessantíssima, num desses jornais online, que a cidade de Nova York planeja legalizar os táxi-bicicleta.
Pensei comigo: “Meus Deus, acho que vou vender meu Del Rey e comprar uma magrela, quem sabe se mais essa nova profissão não chega logo por aqui...”

Raimundo Candido

Paulo Nazareno disse...
Saboroso,bem humorado, perspicaz dentre outros atributos. Que coisa Raimundinho!Só lembrando que daqui saiu também,pela luz do nosso confrade Lucas Evangelista, uma música (vendida por êle ao Mastruz com Leite) acerca do tema.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

ALC - NOTA DE ESCLARECIMENTO

Tendo em vista veiculação, neste blog (blognilos.blogspot.com), de debate construído na rede social facebook, envolvendo o nome da Academia de Letras de Crateús – ALC, em torno do Livro “Crateús: 100 anos”, publicado em 2011, por esta Arcádia, com o apoio do Banco do Nordeste, da Prefeitura Municipal de Crateús, através da Secretaria de Educação, dentre outros, vimos esclarecer:

1)      O livro tem abordagem histórico-antropológica acerca da centenária cidade de Crateús, sem qualquer pretensão de abarcar toda a história. Até porque, ao nosso entender, “toda” a história de um povo não cabe num único livro, quiçá alcançável. Mas o livro promove grande levante da nossa historia e antropologia, desde os tempos remotos das Tribos Karatis até os dias presentes;
2)      O livro não se destinou a biografar ou homenagear personalidades. Os muitos nomes citados nos artigos constam na condição de sujeitos históricos dos fatos ali relatados. Assim constam também as contribuições de Madrinha Francisca, Rosa Moraes e Dona Delite para a educação de nossa cidade, esta última, inclusive, têm três de seus filhos integrando a ALC, sendo dois como membros fundadores e uma como patronesse.
3)      Sendo um livro de artigos históricos, escritos por sujeitos pensantes/participantes da vida sociocultural e política, a abordagem dos fatos expressa a visão de cada pesquisador, vez que ninguém é neutro. Entretanto, todos os artigos são fundamentados nas fontes pesquisadas, nos relatos dos sujeitos e documentos de registro, segundo os princípios da metodologia de pesquisa acadêmica, o que lhes dá veracidade científica, até que outras teses, também à luz da ciência, os negue.
Alegra-nos ser nosso livro objeto de debate, pois é esta a finalidade de qualquer publicação. Mas alertamos que o juízo sobre o desconhecido, isto sim, pode resultar em injustiça irreparável. Recomendamos, pois, em glória de nossa cidade e de muitos dos seus sujeitos históricos, a leitura de todo o livro, subscrito por mais de 30 autores e outras tantas dezenas de contribuições, mediante entrevistas, documentos e informações. Assim feito, estamos abertos às críticas, contestações, antíteses e discordâncias, que ajudarão nós todos a nos auto reconhecermos como crateuenses.
O livro se encontra a disposição na nossa Sede, à Rua do Instituto Santa Inês, 231 – no Centro de Crateús.
Cordiais Saudações.
A diretoria da ALC

Convite aos Acadêmicos

Comissão Brasileira de Justiça e Paz
Organismo vinculado à CNBB

"Que a SAÚDE se difunda sobre a terra"
Lema da Campanha da Fraternidade 2012

Constitui objetivo específico da  CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2012 "despertar nas comunidades a discussão sobre realidade da saúde públca (...)" Engajada na mobilização nacional, A COMISSÃO DIOCESANA DE JUSTIÇA E PAZ, através de seus membros efetivos e suplentes, vem solicitar vossa prestigiosa presença e/ou de representante(s) dessa Instituição na REUNIÃO preliminar que fará realizar nesta Cidade, no SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS, situado à Rua do Instituto Santa Inês, 413 - Centro (próximo ao Clube Sargento Hermínio), com início previsto para as 17:00h (CINCO HORAS DA TARDE) da SEXTA-FEIRA, DIA 02 DE MARÇO DE 2012.
(SIC)

sábado, 25 de fevereiro de 2012

O homem na minha cama


vou te dar um abraço nu
em pelo e suor
e me encaixar
feito pecinha de quebra-cabeça
em teu corpo
vou te dar beijos vestidos
em língua e salivas
onde possa saciar
a sede que me consome
vou te dar minha pele
perfumada em gozo
quando deitares na minha cama

Karla Gomes

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Viva! Crateús tem Carnaval

Foto: Júnior Sá

Depois de muito vai e vem, de muito disse-que-disse, de um "aparente" desinteresse da administração municipal e de muita pressão dos foliões crateuenses – que inundaram as redes sociais com apelos e protestos – finalmente está decidida a programação do Carnaval em Crateús.

Foi em cima da bucha, mas o que conta é que ele vai acontecer, malgrado a ideia de jerico de reavivar os famigerados "paredões de som" (vide o artigo "Ferro na Princesa", de Edilson Macedo).

A programação oficial traz, como principal novidade, a alegria de devolver o "corredor da folia" ao seu lugar de origem: a Praça dos Pirulitos! Só por esta atitude sensata, a prefeitura já leva um 10, com louvor, em minha modesta avaliação. Marcando pontos importantes no quesito "evolução", abandonou a lamúria do "não há dinheiro" e finalmente, no acender das luzes na avenida, contratou uma carrada de bandas – inté da Bahia, vejam só! Então, de sábado até terça-feira, a putaria vai comer é de esmola! – no bom sentido, é claro.

Até mesmo os Blocos Oficiais, que ameaçavam um boicote em razão dos poucos recursos oferecidos e dos atrasos no repasse desse dinheiro, correm feito doidos pra fazer bonito. A informação é que desfilarão pela avenida a sua história (Mandacaru), a história da música nordestina (Tykeré) e meu Ceará é assim (Malagueta). Sempre vale muito a pena conferir.

Quanto aos blocos alternativos, aí é outra história. É pau de dar em doido. A diversão é certa, a alegria é garantida. Chega a dar saudade do mestre Manoel Picolé e seu Ás de Espada. Oh tempos bons aqueles!

Enfim, a mesa está posta e os convidados todos avisados. Vamos à folia! Vamos cultuar outra vez esse deus doido da farra e do desatino. Se preocupe não: na quarta-feira a gente se prostra arrependido e roga mais uma vez a deus o seu perdão... pelo menos até o próximo ano.

Lourival Veras

                    Cícero Maçal, o Encantador de Cavalos.

Bem cedinho, mal as vassouras de piaçabas ciscavam as invisíveis poeiras nas calçadas – costume de quando os terreiros eram de terra batida e as casas de taipas – as patas de ferro já trotavam no rijo calçamento emitindo um firme e percutível som. Não li, até hoje, uma fiel e onomatopéica imitação deste belíssimo ruído, parece-me com um pa ta ti pa ta tá pa ta ti pa ta tá em ritmo veloz e harmonioso. Era um Manga Larga machador chamado “O Corcel” cavalgado pelo elegante Cícero Maçal, lembrando-me o atrevido Capitão Rodrigo Cambará de o Tempo e o Vento, que subia pela Rua Frei Vidal rumo ao centro da cidade, numa infalível visita aos seus digníssimos amigos.
           Antes, passava pela casa do Compadre Caboclo, na Rua São José, só para lhe apoquentar o juízo e dar um bom dia à Comadre Janoca, com um dedal fincado no dedo médio e a pedalar sem sair do lugar, numa antiguíssima máquina Singer.
            A criação de gado, desde a época do Ciclo do Couro, alojou-se nas margens do Rio Poti como uma coluna mestra a suportar e favorecer o lento desenvolvimento do município, mesmo padecendo de cruéis e periódicas secas que dizimaram a um quase inexistente rebanho.
           Como uma extensão da cidade, a Fazenda Boa Vista era anexada por uma alameda de altíssimos Paus Brancos, aonde os nômades ciganos se abrigavam com seus animais suspeitos.
            Na madrugada os galos entoavam seus cocorococós acordando toda passarada e os exibicionistas pavões. O vento balançava uma rede de tucum armada no arejado alpendre, de onde se via o fluir da carroçável, a levar os transeuntes apressadamente para o povoado do Quirino. Dali, seu Cícero, os convidava mesmo que não os conhecesse:
             – Apeiem-se, meus amigos, venham tomar um cafezinho!
             Após a lida de tocar o gado para a malhada e abastecer de ração os cochos da vacaria, inquieta-se com as condições reduzidas do capim na vazante da croa do rio, mas logo deixa a preocupação de lado para fazer o que mais gosta, o que realmente lhe dá prazer: o exercício de domar cavalos.
               Sabe que conquistar um animal, sem lhe tirar o brio, sem lhe reduzir a esbeltez e o fausto escultural da nobreza é obra de um raríssimo dom. Usando de instrumentos brandos chega ao seu coração, por dura disciplina e infinita paciência, conquista-o com aquela confiança que persistirá para o resto da vida, uma compreensão que está acima de qualquer raciocínio lógico. Só mesmo um mago encantador como Seu Cícero Maçal, para integrar cavalo-homem num só elemento, num só corpo a agir pela vontade do dono, num respeito mútuo, até as respirações se combinavam e ficavam no mesmo ritmo. 
               Quantas vezes, no comando da voz, o Corcel dirigia-se, instantaneamente, a sua presença, deixando os transeuntes boquiabertos daquela cega obediência a mostrar que o animal era mais que um cavalo pronto a montaria, mas um amigo que se trata com veneração, fazendo valer um antiguíssimo ditado: Mostra-me teu cavalo e te direi quem és...
               Um cavalo! Um cavalo! Meu reino por um cavalo. Gritou o Rei Ricardo III, lá na longínqua Inglaterra, antes de ser derrotado numa sanguenta batalha. Se tivesse encomendado ao Seu Cícero, teria sido salvo com um cavalo muito bem adestrado.
              Mesmo sendo uma pessoa pacifica e sossegada, a zelar pela retidão de caráter e pela honradez de seu mundo, tinha momentos de tolerância zero com os erros alheios, tornando-se temporariamente espoletado, como uma brasa apagada que recebe um vivífico sopro.
               O sujeito que levara as suas ovelhas, era um gatuno por vocação, não merecia mesmo um pingo de consideração, e Seu Cícero Maçal não deu a mínima atenção para aquelas frívolas ameaças de desforra. Mas o ódio, a vingança dos indivíduos covardes, queria ser despejado onde menos a razão o indicasse, pois é uma diabólica companhia e cega quem o abraça.
               O infiel gatuno, como um rato covarde, ronda pelo terreiro da Boa Vista e na visão do esbelto tordilho, livre a pastar por ali, enxerga o vulto de seu Cícero Marçal. Uma lâmina afiada resplandece ao sol, na mão de quem leva a infame perversão na alma.  
               Uma cena que sempre me causa compaixão, quando a leio, é a crudelíssima morte dos cavalos de Riobaldo Tatarana , no livro Grande Sertão Veredas, de João Guimarães Rosa. Estavam todos confinados na casa velha da Fazenda dos Tucanos, e por tiros inimigos vindos sem pena de Hermógenes e seus desumanos jagunços que ali os encantoam, enquanto todos os animais estavam guardados num curral fechado... É Riobaldo que conta:
             "(...) Mas, no sobrevento, o Cavalcânti se exclamou:
               — "A que estão matando os cavalos!..."

               Arre, e era. Aí lá cheio o curralão, com a boa animalada nossa, os pobres dos cavalos ali presos, tão sadios todos, que não tinham culpa de nada; e êles, cães aquêles, sem temor de Deus nem justiça de coração, se viraram para judiar e estragar, o rasgável da alma da gente - no vivo dos cavalos, a tôrto e direito, fazendo fogo! Ânsias, ver aquilo.”
               Sem temor de Deus, sem um pingo de justiça no coração o perverso gatuno desfere duas punhaladas mortais no corpo do inocente Corcel que sangra até cair.
               Correm para chamar Seu Cícero Maçal que não suporta o sofrimento do fiel amigo, não consegue olhar aquela difícil aflição. O veterinário, chamado as pressas, já desistiu e manda arrastar o animal para acabar de morrer na beira do rio.
               Uma comoção domina o alpendre da Fazenda Boa Vista, um peito fechado, uma intraduzível dor a se misturar com a crescente revolta, mas eis que, repentino, levantam o olhar e todos ficam incrédulos. Na estrada, o Corcel caminha vagaroso, penosamente puxando o passo que a pouco trotava pela Frei Vidal. Arrasta-se, rumo ao seu dono, como para a agonia da última despedida, pois somente no adeus frontal, olho no olho, somos capazes de compreender a profundidade de uma grande amizade ou de um incondicional amor, mesmo entre o ser humano e seu querido animal.
               Alguém viu cristalinas lágrimas escorrem da face do cavalo, que se foi sem um relincho, como um sopro de brisa que partiu a galopar deixando uma triste poeira daquele dolorido silêncio. Como os cavalos de Riobaldo, o Corcel tordilho de Seu Cícero Marçal partiu, trazendo a lembrança da poetisa Cecília Meireles que verteu estes versos para toda despedida equina:
Vi a névoa da madrugada
deslizar seus gestos de prata,
mover densidades de opala
naquele pórtico de sono.

Na fronteira havia um cavalo morto.
...

Mas todos tinham muita pressa,
e não sentiram como a terra
procurava, de légua em légua,
o ágil, o imenso, o etéreo sopro
que faltava àquele arcabouço.

Tão pesado, o peito do cavalo morto!

                                                                                                                       
Raimundo Candido.

Jose Alberto de Souza disse...
Bárbaro, pungente, comovedor,
digno das observações agudas
de um grande escritor

João Silas Falcão Soares disse...
Poeta, excelente resgate de memória. Inúmeras vezes presenciei o Cícero Maçal indo/vindo do centro de Crateús pela Rua da Cruz em seu Manga larga veloz e competente no trote. Sempre relembro esta magnifíca imagem. Nunca o vi dentro de um carro. Sempre achei muito personalidade dele não se desgarrar do Manga Larga.

Parabéns Poeta.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A tia da Graça

E assim se vão fechando, momento a momento, estas pérgulas por onde os raios de luz de minha infância, iluminuras de minha vida, emergiam. Última acha que ardia no lume do meu passado. Hoje uma sombra de saudade. Ancora sobre os meus dias. Os brilhos vão se escurecendo neste sítio bendito da memoria, onde as flechas tomam conta de nós. Onde estão aqueles sorrisos de graças que pousavam doçura sobre todos. Hoje se vai a última tia. A tia Gracinha. Morre Maria das Graças Bonfim. Aquela alegria pueril. Aquela fala mansa, qual um poema. Aquela apascentadora amiga, afogada em afagos, que explodia quando a aurora de nossas vidas ainda borbulhava. Um coração de Adamastor, carregando as pertenças do amor. Um mar generoso, leve, de um marulho silencioso, ia a querida Tia a nos trazer as graças da felicidade. O sol ainda ruminava no ventre da noite, a nossa mãe sazonal, nos enchia de mesuras. Hoje ela se vai, no dorso inquieto do tempo. Leva de cada um de nós mais de um quartil de viva felicidade. Ficamos nesta penumbra de anoitecer, com cheiro de cipreste nas canaletas da morte. Nestas cinzas que tingem tanta magia, naqueles dias distantes. De tardes fagueiras. De tantas noites telúricas sob o lume do luar. Sucumbimos ao passado. Pesarosos voltamos a Crateús para enfrentar estas esfinges famintas que nos devoram a todos. Apaga a última estrela de opala, como diz Bilac. Faz os nossos olhos vazios, lacuna na mente, pedra na alma e a dor infinita no peito. Tao somente o peso da saudade. Graça, que vestia o nosso luar de sedas e purpurinas. Que nos protegia dos açoites das noites. Hoje sobra este olhar marmorizado sobre o tempo. Perdemos a Graça, ficamos sem graça, a morte me parece ser esta veste estendida sobre a dor. Espargindo um bardo triste de lamento e saudade. 

Jose Maria Bonfim de Moraes
Cardiologista.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

                                                        É FERRO NA PRINCESA
                                                                                                           Edilson Macedo

            Deu na Gazeta do Centro Oeste: “Em Crateús, os paredões de som estão tomando chegada e se entocando para quando o carnaval chegar”.
            Meia Verdade não basta, Crateús terá, neste CARNAFORRÓ, concurso de Paredão, sim! É a genialidade de um povo cujo juízo derreteu sob o causticante sol que assola nosso DeSertão...
            O inferno é aqui , e aqui o galo canta ao meio dia, e reza braba nenhuma adianta, nem mandinga nem cara feia, que ninguém arreda o pé e o que é do diabo, o diabo há de levar... a Ética dos outros não nos atinge...
            E começo a acreditar na cosmologia dos Maias, que sentencia 2012 como fim do mundo. Eia!, é aqui mesmo que o apocalipse vai começar! E que Deus se apiede ao menos de nossos TEÚS...

            P.s.: E disse Giordano Bruno, antes de arder no Fogo Santo da Inquisição: “Que ingenuidade a minha, pedir ao poder, que reforme o poder!”

sábado, 11 de fevereiro de 2012

                                                O  Facebookeiro

Tudo que realizamos sobre a face da Terra é só para pleitear a tal felicidade, como uma árvore milagrosa toda arreada de dourados  pomos que nos preceituou um magistrado-poeta chamado Vicente de Carvalho, coisa que nossos passos diários podem, e devem, constatar neste longo e árduo caminhar.
Essa suposta felicidade, quando em nós se instala, gera um simulado sorrisinho que na maioria das vezes é impuro e virtual, pois fica estampado na parte externa do semblante  corporal. A Ventura só é real e pura se o sorrir estiver expresso labialmente na nossa  indubitável alma. Porém, sinto-me na obrigação de os prevenir, não se aprofundem muito nessas minhas fictícias induções filosóficas, é perda de tempo.
É só para lhes dizer que hoje presenciei aquele risosinho virtual de satisfação nos lábios de um animado grupo de viciados no facebook, a mais nova mania entre as redes sociais, que sempre aparecem na internet, esse invisível monstro cheio de tentáculos, chamado de o supra-sumo das democracias, imaginem, e sem ela o mundo não respiraria mais.
Buscávamos   confesso aqui a minha inclusão a mesma felicidade que acompanha a nicotina dos fumantes, ou a cafeína dos tomadores de café, para não citar outras incivilidades mais pesadas.
Com os olhos grudados na página inicial do face, lembro-me das velhas reunião de fim de tarde, com as cadeiras nas calçadas e uma conversa solta sobre amenidades da vida. É como as antigas e adoráveis bodegas, tudo que se procura, tem. Uma belíssima charge me chamou atenção: O cantor Vando vai chegando no céu e São Pedro, precavido, se antecipa ordenando às irrequietas beatas Controlem-se!
O que no face é estampado corre em firme seriedade ou na mais irreverente criatividade, motivo de tanto sucesso no mundo inteiro, mas continuo achando que tem, também, uma substância química bem viciante, como um nicobit qualquer que faz um rebuliço danado na vida das pessoas. É como estar rodeado de amigos e amigas fofoqueiras, dá até para ouvir suas altas e estridendes gargalhadas: KKKKKKKKK!
Fiquei sabendo do cruel e covarde assasinato do palhaço Harley pela postagem do reporter Tony Sales e uma grande comoção tomou logo conta da cidade.
Às vezes o ambiente é mais sofisticado e sinto-me como se estivesse passeando nos corredores de um grande Shooping Center com suas vitrines coloridas, livros expostos nas prateleiras, fotografias espalhadas numa demonstração de sadia vaidade pessoal.
O website é uma sala de aprendizagem virtual onde os professores são alunos numa interatividade transdisciplinar, como num histórico e automático forum romano, praticando a cultura plural. Aprendi a usar o coletivo @#%!* que abrange uma infinidade de palavras impublicáveis, e  usamos recentemente para defender o nosso querido Sertão de Crateús, pois alguns internautas, por serem analfabites ou por mera ignorância geográfica, querem nos infincar é lá no distante Vale dos Inhamuns.
Sempre leio o erudito amigo Luiz Bonfim, com suas postagens de interesses atuais:" ‎...a vida é uma roleta, ninguem sabe que bicho vai dá! Eu vi a campanha do Janio Quadros, fez comício em Crateus, sua eleição, posse e renúncia...  vi a turbulência por ocasião da transição e da posse de Jango, vi a anarquia generalizada do governo do Jango, vi sua queda e a tomada do poder pelos militares. A coisa tá ficando preta. O Brasil está sem rumo. O Brasil não deve nada ao FMI ? Mas a União deve mais de 500 bilhões ao BIRD e ainda empresta 15 bilhões ao Fundo e ainda financia Cuba. Rodaram a roleta, você sabe que bicho vai dar? " Pergunta-nos ele. (Amigo Luiz, aproveito a agilidade da internet para lhe tranquilizar pelo menos numa coisa, ainda lhe devolverei aquele livro raríssimo de autoria do Dr. Luiz Chaves de Mello, O Telvídeo, que você me emprestou.)
O facebook é um tesouro achado até para os políticos, como os deputados, os prefeitos e os vereadores,  todos estão lá, a cata de amizades e votos, lógico. Por um dispositivo chamado bate-papo, como se fosse um telefone, resolve-se tudo, ali mesmo, e na hora.
Percebo a presença do influente Vereador Márcio Cavalcante, online! Sinto a oportunidade para resolver uma missão, a mim imposta. Por esse bate-papo a conversa começa: Bom dia, Márcio! Amigo Raimundo, como vai? E sou informado que o mesmo havia colocado no orçamento municipal para o ano de 2012 a quantia de 300.000,00 reais para a construção de um prédio para o funcionamento da Academia de Letras de Crateús. Agora é só cobrar do prefeito, avisa-me ele. Uma excelente notícia!
O que eu só não entendo deste tal face, com toda essa complexidade de links, é como o estudante Zuckerberg, que o criou,  tornou-se, rapidamente, um dos homens mais rico do planeta, se nenhum dos viciados facebookeiros, como eu, deposita um tostão furado para o funcionamento do mesmo. É mesmo um milagre desta moderníssima tecnologia que produz até neologismos verbais. Vocês sabem como se conjuga o verbo facebookar? Pois aprendam:
Eu posto.
Tu comentas,
Ele curte,
Nós compartilhamos,
Vós publicais,
Eles riem, e
Ninguém trabalha!

      Raimundo Candido

Elias de França disse...
KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK!
Eita, Raimundo! Um poeta no facebook é que nem um santo no inferno: um grande perigo! Pois não é que ja fez filosofia (ou melhor, poesia) com a nova (quase velha) moda!
Gd abç, Rdo!!!!

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Costumes

Meu pai diz que lugar de mulher
é na cozinha e na camarinha
na sala pra servir o café
na rua, pra companhia.
Diz também que homem
Ficou para o mundo
pro trabalho duro,
jogo bebida mulheres e fumo.
Que sempre foi assim
Deus que quis
e resta aos pecadores respeitar
viver sua vontade.
Meu pai é um homem de muitos saberes.
Mas nem sempre tem razão.



Karla Gomes

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

ALC e o livro "Crateús: 100 anos" na TV


O Programa Papo Literário da TV Ceará gravou entrevista com o presidente da Academia de Letras de Crateús, Elias de França, tendo como pauta o livro "Crateús: 100 anos", produzido pela Arcádia, em alusão ao centenário da Cidade de Crateús. A entrevista foi exibida no último sábado, às 19:30h e será reprisada hoje, às 19:00h, amanhã (dia 08/02) às 14:00h e quinta (dia 09/02) às 23:00h.
 
O programa pode ser assistido pelo aparelho de TV ou pelo Site da TV CEARÀ, de qualquer lugar do mundo, pelo endereço:
http://www.tvceara.ce.gov.br/categoria1/tvc-na-internet, nos respectivos horários.

Silas Falcão disse...
Assisti a entrevista. Muita boa. Belas edições de imagens da nossa cidade. A Mônica, entrevistadora, através das perguntas, extraiu competentes e históricas respostas do Elias de França.
Parabéns presidente.

Elias de França disse...
Obrigado, meu caro confrade Silas, pelas palavras e pelos espaços que você vem construindo, com muita copetência, para a difusão da literatura de Crateús, na Midia Estadual. Grande abraço!

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Livro conta a história de Crateús


De autoria da Academia de Letras do Município, a publicação reúne contos, artigos e poemas a respeito da cidade

Crateús Em 404 páginas, a Academia de Letras de Crateús (ALC) presenteia a cidade por ocasião de seu centenário, comemorado em 15 de novembro de 2011, com o livro "Crateús: 100 anos". A obra, escrita a muitas mãos - pelos 30 membros da ALC - conta a história dessa cidade centenária com um diferencial das obras dessa envergadura: o fato de relatar a história de forma não cronológica. Por meio de artigos, contos, memórias e poesias, o leitor pode abrir o livro em qualquer página, seja no início, meio ou fim, e terá a oportunidade de conhecer a história de Crateús, contada pelos acadêmicos, que fizeram sua escolha literária de acordo com a sua identificação e estilo. Nos próximos meses, a obra será lançada em Fortaleza e Brasília.

"São enfocados fatos que, por si, contam a história. Elegemos os marcos importantes, após inúmeras reuniões e cada acadêmico escolheu sua opção e forma para contribuir com a obra. Foi realmente uma construção coletiva", explica Karla Gomes, secretária da Academia.

Apesar de ser definido como um presente para a cidade, de acordo com a própria ALC, o livro não se prende somente às comemorações do centenário. A publicação servirá de guia de consulta para as próximas gerações. "Trata-se de um trabalho de conotação histórica. Sua publicação e leitura não se prendem tão somente às comemorações do Centenário de Crateús", expressa o escritor e membro da ALC, padre Geraldinho.

Elias de França, presidente da entidade, ressalta o caráter histórico e memorialista do livro, além da visão da ALC em reconhecer a importância de registrar a data e os fatos para a posteridade. "A ALC, por seu turno, desde o início se mostrou desperta para uma passagem de centenário que não se encerrasse no dia 15 de novembro e nem no Revéillon 2012".

A dificuldade de obter informações sobre a história do Município é analisada pela ALC, que destaca o déficit de conhecimento histórico-antropológico acerca de Crateús. Alguns membros foram às cidades de Oeiras e Teresina, no Piauí, em busca de fontes e vestígios. Encontraram poucos e envelhecidos registros cartoriais e administrativos da Vila Príncipe Imperial, antiga denominação de Crateús.

"O nosso Município centenário é estabelecido às margens do Rio Poti, cujo vale já pertenceu ao Estado do Piauí, desde a nascente, na Serra da Joaninha, até o alto da Chapada da Ibiapaba, transferido para o Estado do Ceará, em troca de área litorânea do porto de Amarração, mudança que deu causa a um secular litígio entre as duas federações envolvidas, com muitas consequências, especialmente para os moradores das áreas disputadas. As memórias socioculturais de sua composição demográfica anterior e seus respectivos hábitos e costumes, naturalmente, foram ficando no esquecimento, em face da ação histórica dos novos ocupantes e seu fluxo de relações", frisa o presidente.

Por essas questões, a ALC define a obra como "um grande mosaico de visões e impressões sobre a história do nosso povo, montado sob olhares e estilos literários os mais diversos", de acordo com França.

Capítulos

Dividido em quatro capítulos, a publicação traz das origens da cidade às expectativas de futuro, passando pelo enfoque do centenário. No primeiro capítulo, aborda as nascentes geográficas dos Sertões de Crateús, bem como o vale do Rio Poti e seus primeiros moradores. O segundo capítulo enfoca Crateús já em sua condição de cidade. Mostra os distritos, terras, direito e justiça, além de bases religiosas. O terceiro capítulo é dedicado à cultura, patrimônio e educação, destacando os escribas da terrinha, manifestações folclóricas, politização e ensino superior.

No último capítulo, são apontados os marcos históricos dos 100 anos de Crateús: a chegada do trem, passagem da Coluna Prestes, a prisão da santa, a chegada do Batalhão de Construção, a Igreja Popular de dom Fragoso e outros fatos marcantes.

Silvania Claudino
Repórter / DN

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Último ato

 

Harley Harley, o palhaço
Morreu
Após ser chicoteado,
Com uma facada
No abdômen

Na plateia
O filho Let The Sunshine
(o palhaço Lengo Lengo)
Como único
espectador

Edilson Macedo
                                               Sensibilidade Arbórea

Quando a pontiaguda Espada-de-São-Jorge, inesperadamente, penetrou na batata da minha perna, como um afiado arpão, uma violenta e dilacerante dor me fez lembrar imediato (sem falar de uma inefável e inconveniente vontade) do sofrimento daquele dragão retratado numa lua leitosa, eternamente espetado numa haste pontiaguda. Que dor horrível o coitado é obrigado a suportar, toda noite. Eu já nem penso mais no heróico Santo Guerreiro, estou compadecido é do pobre dragão.
Cuidado aí com a Espada-de-São-Jorge, Raimundinho! Esta plantinha é cheia de lanças e protege a casa contra os inimigos.
Avisa-me, Das Dores. Mas agora é tarde, Inês já é morta e um filete pastosamente rubro escorre pela minha perna.
Por que a Senhora coloca essa armadilha assim, tão perto da porta, Dona das Dores? Olhe que eu nem sou seu inimigo e essa monstruosa plantinha já quer me matar! Murmuro entre os dentes, tentando disfarçar uma agonizante dor que lateja no nervo da perna e sobe mordendo até miolo do cérebro.
Aquela mulher é uma incomum fada que vive embevecida com o sobrenatural das árvores e possui um imenso quintal, que mais parece uma miniatura da Floresta Amazônica, com todos os tipos de plantas medicinais. Ela vai, didaticamente, explicando as propriedades curativas de cada uma, enquanto meu olhar se perde por entre as folhagens e os ramos inextrincáveis do seu plantio caseiro.
Este aqui, bastante ramificado, é o Boldo que serve para os problemas do fígado, como a ressaca, você sabe, e serve até para dor de barriga (Volto há 20 anos, que alivio!), toma-se no chá feito da folha. Esta é a Erva Cidreira, o melhor calmante do mundo (Hesito um instante com a informação, será que necessito?). Olhe aquele lá no canto, é o milagroso Mastruz para os pulmões, cura pneumonia, bronquite, raquitismo e chega até a sarar as feridas. Faz-me recordar da quase esquecida dor na perna. Ela prossegue divulgando suas plantinhas e fico a pensar na sábia mãe natureza, além de tudo nos dá de mão beijada, uma farmácia completa.
Outro dia, lendo a Vida Secreta das Plantas de Peter Tompkins e Cristopter Bird, na Biblioteca do Google Books, fui tomado de um súbito espanto ao saber que os vegetais possuem uma sensibilidade quase humana, que eles memorizam experiências de prazer e dor, sentem afeto e medo e são até capazes de se comunicarem com os homens.
Explico a Dona das Dores que o motivo de minha visita é simplesmente comprovar ou refutar aqueles inacreditáveis fatos e nada melhor que a palavra de uma perita que convive com as plantas, afeiçoada na lida diária, que dorme e acorda com elas.  Percebo um olhar demorado e perscrutador de uma Duente, a inquirir minudentemente a minha alma, como se eu fosse uma de suas árvores com folhas, ramos e caule e que acabou de dar frutos. Momentaneamente sinto um gelo quente na medula dos ossos, acho que foi o medo!
                 — Graças a Deus, amigo Raimundinho, você apareceu por aqui, agora posso conversar com alguém que, com certeza, me entenderá e não vai sair por aí afora dizendo que eu perdi o juízo só porque converso com as plantas.
Foi como se abrisse um daqueles livros raríssimo e amarelado pelos séculos, onde se guardam sagrados mistérios que nós, pobres mortais, nunca podemos saber.
— Primeiro eu lhe peço desculpas pela Espada-de-São-Jorge, notei que ela te confundiu com um inimigo, mas agora que sabemos quem você é realmente, sinta-se em casa! Tive a leve impressão que havia por ali, outras presenças, além de nós.
— Vou te contar tudo sobre as plantas, disse-me. Saiba que a vida que gozamos, neste velho corpo cansado, devemos agradecer a elas. Desde o sopro de nossos incansáveis pulmões, a esta energia pulsante no peito, até o reluzente brilho nos olhos, tudo isso é dádiva vegetal. São seres divinos cobertos de tantos mistérios que nem mesmo a sua observadora ciência chegou, de perto, a decifrar.
— Isso eu já sei Dona das Dores!
Ela sorri, ao notar minha impaciente curiosidade, e continua a falar confiantemente:
— Saiba você, que elas não gostam de barulho, possuem uma audição muito sensível, preferem a melodiosa voz do silêncio ou a música clássica de um suave violino. Inconscientemente, quebro um raminho verde de uma planta, confirmando um velho hábito.
— Pois bem, vamos ao que você quer saber realmente, elas têm consciência, sim, e reagem às pessoas. Esta plantinha que você acabou de quebrar um galho sentiu dor. Como não foi por maldade que você fez isso, ela suportou. As plantas não toleram é a maldade.
                 — Veja esta planta da folha larga e brilhosa, ela é muito poderosa, absorve a energia negativa das pessoas mal-intencionadas, como o mau-olhado, a inveja, e as transforma numa substância diferente que fica dentro da própria folha, por isso ela é muito venenosa, é a famosa Comigo-ninguém-pode.  São muitas as plantas com esses poderes especiais: a Arruda, a Pimenta, o Alecrim, o Manjericão, o Abre-caminho, o Pião-roxo, todas comprovadas pelas experiências pessoais e pela tradição histórica de milhares de gerações no longo caminhar da humanidade. Na Grécia antiga as mulheres já andavam com raminhos de arruda nas mãos, como um amuleto, para proteção. Você já deve ter visto um quadro do famoso pintor Jean Debret onde retrata o comércio de arruda, feito por escravas nas ruas do Rio de Janeiro.
— Raimundo, se tiver tempo, de uma voltinha pelas ruas da cidade e veja o que há na entrada das casas, olhe nas portas dos comércios do centro, você vai perceber como as plantas têm trabalhado duro para proteção das pessoas. É um fato, pode acreditar. Mas quero te alertar para uma coisa muito importante, algumas pessoas carregam uma maldade tão forte que estas plantas não suportam e morrem, você me acredita? Pois eu já vi gente secar uma planta só com o olhar!
Despeço-me, agradecido, daquela respeitável senhora, fada benfeitora das plantas, e olho assim meio atravessado para aquela Espada-de-São-Jorge que ainda não me parece nem um pouco amigável.  Saiu dali convicto de que, tanto no mundo animal como no reino vegetal, há algo a mais que minha vã expectativa, e que a minha vida sempre estará fundamentada, convicta e saborosamente,tanto nos fatos reais da vida quanto nos indecifráveis mistérios que nunca decifraremos, nem com a morte.

Raimundo Candido

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Ultima palavra

Elias de França
Não, não me olhem assim
com os olhos de dores e indagações
Não tenho mais palavras

Nada mais direi
de pranto, pesar e culpa...
Até as flores já cheiram à parafina
e as brisas, antes doces, cantam incelências.
O verso não cura nem alivia: engana(dor)!
Cantar a morte é matar o instante

Câncer, tragédia, homicídio, suicídio...
Rezas, epitáfios, cartões pósteros...
Como um pássaro, um cão, um rei...
tudo é simples e terrivelmente morte:
inexplicável, feio, irremediável.

Não me olhem assim
Não me queiram nem tentem me dar palavras
Apenas carreguemos, vivos,
as pesadas cargas de saudades!

Raimundo Candido disse...
Como um Messias ou  incomum profeta, os poetas (Elias!) transportam as dores do mundo, mas como extraordinários magos ou bruxos as transmutam em pura alegria para o espanto dos olhos daqueles que ainda aprendem a enxergar  poeisa ( Eu!).

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Montanhas, garças e Maria


Elias de França
As garças, nunca se sabe
Se em pouso ou em pose
Seja no jardim ou lago
Se de gesso ou osso e carne
Textura: tinta ou plumagem
Se o branco é divindade
ou disfarce das imundices que engole...

Montanhas, nunca se sabe
se são azuis, roxas ou verdes
as torres, de pedra ou nuvem
além, aquém do horizonte
Se pôr os pés
ou só o olhar...

Maria, nunca se sabe
Se é poeta ou canalha
seu bem-querer, afinal,
Se um, tantos ou ninguém
Se eu ou todos os outros...
Se é amada também!

Memória fluvial
                                                                            (Ao rio da Dona Delite)
Refletia tanta água
no sábio facho de luz,
por onde seu riso lacrimal
e ríspido, fluía obsequioso.

E se alagava, pelos baixios,
lívida num liquido rosto,
imagem a se perder de vista
grudada nas águas do poço.

Num imprescindível fluir
dissipou-se, gota a gota,
até seu último anseio
pela sedenta calha do rio.

Das águas, antes perenes,
a confluir em magistral dança
só remanesce um jorrar escasso
de uma intermitente lembrança.

Raimundo Candido

Paulo NazarenoFeb 2, 2012 12:30 PM
Cristalino!
Em tempo: por obséquio,mande a dica de como publicar neste site.
Carpe Diem.
PN.