quinta-feira, 22 de março de 2012

Três escritores de Crateús lançam livros amanhã em Fortaleza


Elias de França (Presidente da Academia de Letras de Crateús), Lucas Evangelista (Tesouro Vivo da Cultura Cearense) e Lourival Veras (membro da SABI) estão entre os escritores cearenses que terão suas obras lançadas amanhã, pela Secult, na Praça do Ferreira, em Fortaleza.

Produção literária do Estado aquecida por novos títulos 

Em breve, 100 novos autores cearenses devem ter seus nomes arrumados em estantes de bibliotecas, livrarias e outros espaços dedicados à leitura no Estado, a partir do lançamento coletivo das obras financiadas pelo Prêmio Literário para Autor Cearense, cujo resultado foi divulgado recentemente.

O prêmio representa o maior investimento em produção literária já realizado pelo governo estadual, e o maior oferecido no Brasil em valor global - ao todo, R$ 2 milhões. De 317 inscritos, 110 proponentes foram selecionados e desenvolveram suas obras ao longo de 2011. Amanhã, o resultado poderá ser conferido de perto pelo público, em um espaço de exposição e de manuseio montado, na Praça do Ferreira, a partir das 15 horas. A cerimônia de lançamento, com presença do secretário da Cultura, Francisco Pinheiro, e demais autoridades, acontece em seguida, às 17 horas.

"Os outros dez contemplados ainda estão finalizando seus trabalhos, que devem ser disponibilizados em breve. Mas como já tínhamos marcado a data, fechamos o lançamento sem eles", explica o coordenador editorial da Secretaria da Cultura do Ceará (Secult) e responsável pela elaboração do edital, Raymundo Netto.

Idealizado pela Secult ainda na gestão do então secretário Auto Filho, em 2010, o prêmio tinha por objetivo estimular a produção e valorização dos autores e editores radicados no Ceará, promover a circulação do livro, preservar o patrimônio literário e incrementar a produção editorial estadual. Tratou-se de uma ação pontual do órgão, ainda sem previsão de se repetir.

"O valor investido foi muito grande, especialmente se comparada àqueles normalmente destinados à produção literária. Felizmente, também conseguimos contemplar um número grande de pessoas, o que revela o potencial do Ceará na área. É preciso dar visibilidade a esses resultados, pois eles justificam a realização de novas edições da ação", avalia Netto. Segundo o coordenador, foi a primeira vez que os contemplados receberam prêmio em dinheiro, além da verba para publicarem os trabalhos (que variou entre R$ 2 mil, para folhetos de cordel, e R$ 100 mil, para livros ou álbuns de arte).

Outra diferença importante foi a contemplação de gêneros até então ignorados pelos editais de literatura, como quadrinhos, revistas literárias, álbum ou livro de arte e selos editoriais. Além dessas, mais 10 categorias constaram no edital: poesia, conto, romance, crônica, reedição, cordel, ensaio sobre tema cultural, ensaio ou crítica literária, literatura infanto-juvenil e dramaturgia.

Todas receberam nomes de autores e personalidades cearenses de relevância, a exemplo de Moreira Campos (conto), Jáder de Carvalho (romance), Milton Dias (crônica), entre outros. "A diversidade de categorias permitiu oferecer uma gama muito maior de oportunidades. Gostaríamos que isso se repetisse", ressalta Netto.



Impacto

O edital inovou ainda ao exigir a edição e impressão das obras em editoras e gráficas do Ceará, garantindo o investimento no mercado local, e ao destinar recursos para se planejar a distribuição dos títulos, além da reedição daqueles de interesse geral. Também foi exigida a contemplação nas propostas orçamentárias concorrentes de todos os serviços editoriais necessários (revisores, ilustradores, designers etc), o que resultou em projetos gráficos mais audaciosos e elaborados.

No sentido de reduzir ao máximo a burocracia inerente a seleções públicas por edital, foram realizadas oficinas de preenchimento de formulários e de planos de trabalho.

No caso de proponentes do Interior, destacaram-se a comunicação por e-mail e o envio de manuais de apoio. Dos 110 projetos contemplados, 24 (quase um quarto do resultado) vieram de fora da capital, distribuídos entre 19 municípios, como Limoeiro do Norte, Juazeiro do Norte, Crato, Iguatu, entre outros.

Segundo Netto, todos os segmentos da cadeia criativa e produtiva do livro foram beneficiados pelo prêmio. "Por se mais amplo, o edital valorizou os segmentos do mercado. Muitos autores foram publicados pela primeira vez. A inclusão da categoria de selo editorial, por exemplo, favoreceu a criação de selos por parte das editoras e gráficas. Algumas inclusive já nos perguntaram quando acontecerá a próxima edição", observa Netto.

"A categoria de ensaio sobre tema cultural, por sua vez, favoreceu a pesquisa, ao contemplar acadêmicos que não tinham onde publicar seus trabalhos", complementa. A lista de selecionados está disponível em secult.ce.gov.br



Mais informações

Exposição e lançamento coletivo das obras do Prêmio Literário Para Autor Cearense. Amanhã, das 15 às 20 horas (solenidade às 17 horas), na Praça do Ferreira (Centro). Contato: (85) 3101.6794



ADRIANA MARTINS
REPÓRTER 

quarta-feira, 21 de março de 2012

NENEN FRANCELINO

Se tivéssemos que extrair, do imenso e singular painel da vegetação nordestina, uma bandeira para homenagear a radiosa teimosia, a valente esperança, a gratuita hospitalidade, o horizontal sorriso do homem sertanejo, certamente esse estandarte atenderia por uma sagrada madeira chamada Juazeiro

O nome Juazeiro, fruto de um matrimônio silábico do Tupi com o Português - "juá" ou "iu-á" (fruto de espinho) e o sufixo "eiro" – bem traduz o efeito da nossa “Invenção do Mar”, o achamento brasileiro e sua conseqüente miscigenação. 

A mais voluptuosa mancha de solo do município de Crateús repousa no distrito de Monte Nebo, no calcanhar da Serra da Ibiapaba, que limita o Ceará com o Piauí. Nesse distrito pujante há uma localidade chamada Juazeiro. Ali nasceu, em 12 de fevereiro de 1932, um cidadão encomendado para se aparentar com a nossa árvore símbolo: Francisco Fernandes Sales, o Nenen Francelino, filho de José Francelino Sales e Maria Fernandes de Oliveira.

O Nenen Francelino, que recentemente recebeu os amigos para celebrar as oito décadas de vida, é um permanente som de viola tinindo um louvor à simplicidade da vida. Lembra um autêntico mourão voltado, aquela forma de cantoria tradicional apreciada pelo homem do campo nas noites enluaradas. Sua história é uma chuva de estrofes concatenadas com o povo que apreciou e representou. Fez da lida um verso dialogado, sempre obedecendo à rima que o outro escolheu. 

Ao lado da esposa, Maria de Fátima Moreira Sales, dos filhos James Moreira Sales, Jane Moreira Sales e José Fernandes Sales Moreira Neto, Nenen Francelino se mantém renovado como o solo que o gerou ao receber os primeiros fios celestes. 

Fiel às origens, deitou raízes na região em que nasceu. Como agricultor aprendeu que nossa passagem pelo roçado da vida é sempre uma prosa entre plantar e colher. E invariavelmente colhemos o que plantamos. Por isso optou por espalhar sementes de bem-aventuranças, caroços de ajuda, grãos de doação ao semelhante. Trabalhou com tranqüilidade a fecundação do óvulo da pacificação. Exerceu, durante trinta anos, a missão de Juiz de Paz na região. 

A gente humilde da sua terra, identificando nele um apóstolo da causa pública, alguém capaz de “ver” a “dor” dos eleitores camponeses, o elegeu Vereador por quatro legislaturas. 

Na primeira vez em que tomou assento no Parlamento Mirim de Crateús não recebia remuneração. Aqueles eram bons tempos. Tempos de políticos vocacionados. Tempos em que a fama de um homem público era construída por sobre a rocha da coerência. Com a argamassa da capacidade de ser firme e leal. De honrar a palavra empenhada. De ser inquebrantável no cumprimento dos compromissos. Duro como os troncos das velhas árvores. Bons tempos aqueles...

Tua biografia, Nenen, é um convite à reflexão. Para que estamos em cima deste chão? Certamente, para no alimento por o sal, servir o próximo de coração, acorrentar o mau e espalhar gratidão. Eis o teu recado. Isso é que é mourão voltado. Isso é que é voltar mourão!

(Júnior Bonfim, na edição de hoje do Jornal Gazeta do Centro Oeste e na Revista Gente de Ação)

segunda-feira, 19 de março de 2012



                                                           GPS
 
                             Encontro o seu amor onde você estiver

Silas Falcão
                                 IMPORTANTE !
   Se lampião não veio à Crateús, Crateús vai ao Lampião!

             Uma belíssima música do Acadêmico Edmilson Providência acaba de ser selecionada para o II FESTIVAL DE MÚSICA em Serra Talhada/PE. É a cidade de Crateús que será representada, e mui dignamente, na Terra de Lampião. Parabéns Edmilson Providência, leve o Ernesto muito bem caracterizado de Virgulino e mostre na Terra do Xaxado que por aqui também temos talentos.

sexta-feira, 16 de março de 2012



                                                           A rosa
Doaram-lhe uma rosa. Seus olhos e mãos ameigavam o vermelho da rosa. Delicadamente ela cingiu o rosto com a rosa. Alinhou a máquina em direção a rosa deitada em seu rosto juvenil e clicou. Sorriu para si e a rosa, admirando a fotografia. Embalou a rosa entre os esguios braços tatuados. Nos caracóis dos cabelos castanhos, ela encravou a rosa sem espinhos. Enquanto observava a linda morena criando ininterruptos fluxos de ternuras com a rosa, me perguntei por que recentemente ela tentou mais um suicídio.
 

Silas Falcão
  Caça

Quando o desenhista Jean-Baptiste Debret, um pintor devotado em homenagear Napoleão (Naipolloné como o chamavam seus compatriotas), aceitou o convite da Coroa Portuguesa para vir lecionar pintura na Academia de Artes e Oficio do Rio de Janeiro, em 1816, na certa já imaginava a diversidade incomum e exótica da paisagem do novo mundo para os seus ávidos e destros pincéis. Foram tantos os quadros que revelaram o cotidiano de um Brasil Colônia, que sua obra “Viagem Pitoresca” converteu-se num importante livro histórico. Há um belíssimo painel em que um índio deitado de costa exibe uma extrema habilidade no manejo do arco e se faz acompanhar de dois outros nativos que espreitam um bando de patos voando em sua direção. É a figurinha predileta que ornamentava o famoso livro Exame de Admissão que muito estimulou o interesse dos estudantes pelos encantos da natureza.
          Desde a pré-história, a luta pela sobrevivência induzia à caça. Do indígena com arco e flecha ao humilde caboclo com uma rústica espingarda de ouvido, a velha soca-soca, que a atividade da caça virou uma refinada arte e uma impreterível necessidade. A intervenção de um mito que habitava o mato, o Caipora, se fez necessário para controlar a situação e foi com certeza o primeiro empregado do IBAMA. Indispensável também era depositar uns farelos de fumo de corda no tronco de uma árvore e ainda contar com ajuda da sorte, pois o travesso negrinho montado num dentuço porco-do-mato era traiçoeiro e afugentava as caças despistando o caçador com estalos de galhos e simulando o ruído dos animais em fuga.
         Um poeta e grande caçador, chamado Patativa cantou: ”Eu vou caçando/ a minha vida levando/ com meus cachorros fie,/ com eles nada me imbaraça,/ só não mato muita caça/ quando o caipora não quer.// É quem a caça defende/ e quando o caipora entende/ dos cachorros trapaiá/ o mato fica esquisito/ e o caçador fica aflito/ não mata nem um preá”.
            O Curupira, esse estranho ser que tem os calcanhares voltados para frente, acabou vencendo a todos os caçadores!
Hoje, ouço a Sariema soltar sua gostosa gargalhada, quase nas portas da cidade sem o temor das flechas com ponta de osso ou do atordoante estampido da pólvora, que a fazia disparar em desenfreada carreira.
            Outrora era comum o karati instalar-se num tosco jirau, entre os troncos das Aroeiras, feito cama de varas, só para espreitar a chegada dos animais no bebedouro. Do seu posto de observação arremessava flechas certeiras nas cutias, nas jaguatiricas, nos porcos-do-mato que se exibiam aos bandos, em marcha ligeira.
          Quem passa pelas proximidades do Bar do Chico Correia, já na saída para o Curral Velho dos Poetas, avista Seu Aluísio Cavalcante, tolhido, sentado numa cadeira posta na calçada, pelo resultado de uma inesperada trombose, e nem imagina o fino caçador que fora um dia. Dizem que era protegido de Oxossi, o Orixá da caça. Ao embrenhar-se na mata já fazia parte dela, só se ouvia os estampidos da espingarda e ninguém, nem homem nem bicho, via sequer um vulto de um caçador, pela astúcia,  sutileza e  jeito ardiloso de caçar. Numa caminhada, por uma região propícia, trazia rapidamente duas dúzias de saborosas codornizes, aí era só entregar nas casas que lhe solicitaram a incumbência.
          Outro que não ficava muito atrás era o Quidé, um morador do bairro dos Patriarcas, caçador de olhos, ouvidos e faro apuradíssimos nesta milenar arte de Ártemis. Conhecia todos os segredos para uma caçada eficiente, camuflando-se na mata que nem camaleão. A ardilosa Nambu, a elegante Asa Branca, as tumultuosas Avoantes ou as preferidas Codornizes, ele ia buscar era ao meio dia de um sol escaldante, quando estavam serenamente malhando debaixo de uma moita.
         Numa época, um pássaro malvado que come até cobra queimada, estava dizimando os recém nascidos borregos na Fazenda São Francisco. Os criadores diziam assim: Em céu de gavião, pinto não pia e cabrito não berra! Convocaram então o Quidé para caçar à vontade na região, contanto que eliminasse àqueles que possuem mais coragem que o homem, os famigerados Carcarás. Por um contrato verbal, cada predador eliminado era um saboroso queijo que o caçador levava para casa. Aproveitou então a ocasião e construiu uma forja na beira de um grande açude no qual as aves iam beber, ficou camuflado pela água, galhos e folhas sobre a cabeça. Foi só recolhendo, rapidamente, com as duas mãos, uma centena de sedentas avoantes.
         Um dos grandes espetáculos da natureza é um bando de marrecas viuvinhas fazendo uma barulhenta revoada sobre as chamas amarradas na beira da lagoa, é sem dúvida a mais clássica de todas as caçadas. Em baixo sobre as pedras, insistentemente, as duas chamas, a lavandeira e o rabo curto – todas as chamas tem um nome – esgoelavam-se num i-re rê, i-re-rê, i-re-rê contínuo. E lá de cima o bando todo grasna, respondendo ao chamado, sem perceber o perigo que lhes aguarda na descida. Desfazem aquele belíssimo V de vitoria que sempre nos emociona nos textos de auto-ajuda, e sucumbem ao engodo deslizando pelo ar, com suas asas tremeluzendo à luz da lua, para uma chuvarada de chumbo e o desesperado encontro com a morte.
          Neste momento tomei conhecimento que o Tatu-bola virou Herói Nacional. Pasmado ainda estou, pois o matutão, o bobão achou que um dia aquela couraça conversível iria lhe salvar. Ele está mais é para um mártir santo em acreditar que estaria livre de seus atrozes inimigos, pois se esqueceu do pior deles: o homem. Naquele dia, havia dois cachorros latindo e correndo desesperados pela solta de catingueira, numa noite sem lua e uns destemidos caçadores de primeira viagem levando nos ombros enxadas, picaretas, foices, e lanternas, pulando cercas de um campo aberto, em que os carrapichos disputavam espaço com as jitiranas e as moitas de pega-pinto que rasgavam as roupas e os braços dos incautos aventureiros. No local em que os cachorros acuavam havia um razoável buraco, cavou-se até o amanhecer e tenho a leve impressão de que os pebas que moravam ali ainda riem dos bisonhos caçadores, mas pensei cá com meus botões, se fosse o inocente do bola...
         O tolypeutes tricinctus está confirmado como o Mascote Oficial da Copa do Mundo de 2014, numa belíssima homenagem da Associação Caatinga da Serra das Almas, pois mesmo em fase de extinção, os que restaram e perambulam por esse imenso sertão de Crateús ainda pensam que o mundo é uma bolota e acho que por isso a Fifa o escolheu.
         Agora que todos os olhos do planeta Terra estão direcionados para a Mata Branca deste nosso imenso sertão, devemos pensar duas vezes se formos cortar uns gravetos para acender o fogão a lenha ou se desejarmos uma saborosa avoante assada, nem pense mais em ofertar uma tora de fumo no tronco de uma árvore, o caminho é outro, os buliçosos Curupiras atuais são eficazes funcionários do Instituto do Meio Ambiente... Todo cuidado é pouco!

Raimundo Candido

Elias de França disse...
Grande Raimundo!
Assim você salva o meio ambiente, protege os nossos animais silvestres, mas nos mata de saudades, de um tempo não tão distante em que acordávamos com o canto dos canários e ganhávamos o mato, quais neocaratis, à caça de uma "mistura" para o almoço.
Agora não passamos de neo-ecologistas, chorando a falta do canário, da onça pintada e outros bichos.
Mas salve o Tatu-Bola 2014! Crateús, com sua habilidade de forjar fenômenos nacionais, emplaca mais um, agora INTERNACIONAL. Parabens à Associação Caatinga!
José Alberto de Souza disse...
Ilustre cantador do Cariri:
Que fluência, quanta ilustração e sabedoria você nos transmite. Não é atoa que em suas veias corre o sangue nobre de Dona Delite que lhe deve ter estimulado nesses caminhos literários, que hoje transborda qual manancial de perene resgate da cultura nessa abençoada e gloriosa terra que já aprendemos a amar

terça-feira, 13 de março de 2012

                                                  BICHINHO DE FELTRO
                                                                                                   Edilson Macedo


A moça põe a mão sobre meu peito
Ela: às vezes penso que
Teu coração é do lado direito...
Eu: às vezes meu coração
É do lado direito, na contramão...
Ela sorrir, me olha
Encabulada e me abraça
Como se eu fosse
Um bichinho de feltro


                                               
                                               A ÚLTIMA IMAGEM

Nela a solidão é uma áspera peça de renda preta estendida em sua alma.  
Desde a adolescência, as suas mãos rendeiras criam imagens sem erros de pontos.
Projetando nos bilros a sua própria vida não vivida, ela rendilha, rendilha trocando os bilros com agilidade, frequência e destreza .
Dia seguinte rendado de sol, sobre a almofada com a imagem rendilhada do marido falecido nos distantes bilros da sua mocidade, ela foi encontrada morta.

Raimundo Candido disse... 
Amigo Silas, quem conjuga o verbo bilrar tecido com os raios do sol numa trama de vida e morte, o que é? Só pode ser um extremado poeta do rio Poti!

sexta-feira, 9 de março de 2012


Sonhos

Numa ocasião, já bem remota, um velho bardo começou um poema assim: “Há quem diga que todas as noites são de sonhos”, e de lá para cá se estabeleceu que realmente as noites seriam carregadas de ilusões, repletas de fantasias, tomadas por quimeras que nos intimidam por um negrume medonho, fato que não tem a menor importância, pois o que implica em real valor não são as langorosas inquietações noturnas, e sim os  sonhos que nos conectam a algo invisível e que, certamente, existe entre o céu e Terra.
Há muito nos indagamos sobre alguns sonhos e acabamos apurando outros sonhos bem distintos. Não me reporto àqueles que a gente conduz pela vida afora como uma tartaruga arrastando a carapaça. Esses são os sonhos de Ícaro, que se deixou levar imprudentemente pela sede de liberdade e poder, permitindo que a impiedade solar lhe derretesse as asas, mas isso é assunto para as Ciências Psíquicas. É só observar a parabólica trajetória de alguns conhecidos políticos.
                Refiro-me aos sonhos que até os bebês, ainda no útero, se deleitam ao demonstrar pelo movimento rápido dos olhos numa intuição misteriosa de felicidade e em deleitoso contato materno, fugindo totalmente aos parâmetros do genialíssimo Carl Jung a nos impor que é pela busca de equilíbrio que arrumamos uma compensação. Balelas!
Nem sempre é só recostar a cabeça no felpudo travesseiro para serenamente dormir, precisam-se antes de tudo decantar as vivas inquietações. E no apagar das luzes da loucura do mundo acende-se a luz do eu, permitindo que as aves no fim de tarde pousem, trazendo seus alados sonhos.
 Desde que os poetas estabeleceram as possibilidades das coisas impossíveis, uma aguçada ousadia imbuiu-se, às caladas, no talo dos sonhos aguando o potencial criativo que é de onde brotam as idéias. É como se tivéssemos com uma bola de cristal e nos interrogamos, obtendo como resposta uma leve descarga elétrica do nosso subconsciente.
                Um grande gênio da Química, August Kekulé, uma vez arrancou de um enigmático sonho em que uma cobra abocanhava a própria cauda, a idéia da fórmula estrutural do anel benzênico, liquido inflamável, incolor, de aroma doce e agradável, mas altamente tóxico usado na produção de diversas matérias-primas, provando que dos sonhos despertam-se a imaginação, a fantasia e a própria realidade. 
                Sinto-me, quando estou a sonhar, como um canoeiro a navegar num rio que faz a inter-relação entre o agora, o passado e o futuro inspecionando as profundezas ocultas da minha existência. Como o profeta no oráculo a receber Alexandre, o Grande, Rei da Macedônia antes da invasão de Tiro, o qual sonhara com um lúbrico sátiro dançando na sua frente e a única interpretação possível para adivinho foi “Ele está lhe dizendo: Invada meu Rei, Tiro é vossa!”. Como o jovem Tutmés IV sonhando com o deus Sol a lhe mandar que libertasse a sua imagem, a cruel Esfinge, de uma montanha de areia que há séculos se acumulava sobre ela.
Entretanto, os sonhos que mais me fascinam, por serem arcaicos e poéticos, saltam vivos das páginas da Bíblia, com feições sobrenaturais e proféticas, configurando-se como a verdadeira linguagem do Espírito.
É um esplendido sonho ver os anjos subindo e descendo os degraus uma longa escada unindo o céu e a Terra, incitando a fé do Patriarca Jacó. Sublime também foi o primeiro exame de DNA da história, quando duas mulheres se postaram diante do grande rei Salomão, ambas se dizendo mãe de uma criança e o sábio toma uma firme decisão “Como não conseguem chegar à um acordo, tragam uma espada e partam a criança ao meio, e dêem um pedaço à cada uma.” Numa sabedoria adquerida por sonho e só para governar Israel, Salomão distinguiu o amor a implorar vida, e soube da verdadeira mãe.
Um grande sonhador bíblico e renomado onirólogo chamava-se José, um dia sonhou que o Sol e a Lua e onze estrelas se inclinariam diante dele, este primeiro sonho foi o suficiente para instigar ódio nos irmãos, e começou uma epopéia digna de cinema. Exelente foi a interpretação para o Faraó que sonhara com sete vacas gordas, que foram devoradas por sete vacas magras, e com sete espigas cheias e bonitas que foram comidas por sete espigas secas e feias, num desfecho cirúrgico e comprindo-se o que  disse o profeta Joel: “Derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão visões.”
De um simples grão de areia podemos chegar à complexas constelações pelo simples capricho de um sonho. Das areias, em que os pés humanos traçam o seu destino, os sonhos nos fazem levantar vôo e ruflar a um horizonte distante, e eles mesmos nos trazem de volta, do grão ao Universo, do Universo ao grão.
Sonhei, um dia, sendo arrastado pelas águas turvas do Poti, numa correnteza forte e indiferente ao meu apelo, com suas mãos aquosas a me submergir sem me dar direito de uma despedida na luz do dia... 
Um dia, sonhei levantando a âncora de meu navio e zarpando pelo alto mar percebendo o ínfimo de minha vida conectado a um supremo infinito onde tudo se dilui na luz azulada do firmamento...
Agora mesmo despertei de outro sonho agradável, com uma certeza absoluta que não havia sonhado. Alguém que a pouco partira, voltara para me visitar, ampliando uma dor de saudade e novamente partia, deixando-me somente essa triste e diáfana luz que escorre pelos meus olhos...

Raimundo Candido

Jeoge Portela disse...
Enche-me de alegria quando vejo textos como esse de meu recente mais sincero amigo Raimundo Candido, tenho a esperança que a literatura nunca irá submergir entre esses ilusórios caminhos da falta de leitura e alienação tecnológicas em que estão impregnados nossos jovens. Trocam a boa leitura por jogos mordazes de computadores e vídeo games sem o maior pudor ou excitação. Espero piamente que nossos jovens saiam da inércia que estão e abram um livro.
Francisco Pascoal Pinto disse...
A propósito, Raimundo, acabei de ler Sonhos de Sonhos, do Antonio Tabucci, que considero o mais lusitano dos escritores da Itália. Trata dos derradeiros sonhos de personagens que o autor admira, como Garcia Lorca, Pessoa, Caravaggio, Toulouse-Lautrec etc. Contos curtos bons de se ler. Enviei o livro pra você, ontem, pelo correio.
                                                     

                                                    HETERÔNIMOS

                                                            Deus.

             Silas Falcão

terça-feira, 6 de março de 2012


Sertaneja

Do barro de louça
da beira do rio,
imponderável
é a volúpia,
inquebrantável
é a lida em ardor
que a fé moldou!

Do barro de louça
da beira do rio
emprenhou-se,
cio de carne e pão,
a se tornear, fêmea
plena, expelindo
do útero um sertão!

    Raimundo Candido
 Lourival Veras disse...             
Arrebentou, Raimundo!

segunda-feira, 5 de março de 2012

Descomparações

Não me compares às flores,

por mais que seja bela e perfumada.

Não me chames de uva,

ao me achares madura, doce e saborosa,

ou, por vezes, acre, quando verde.

Tampouco sou abacaxi,

ainda que o tempo me tenha enrugado o corpo.

A valentia, ou a pele macia, não faz de mim tigresa.

Não pretendo ser-te pimenta de odor ou ardor,

por mais que cheire e te esquente.

Não sou tua comida,

mesmo quando me possuis vorazmente.

 Não me tomes por aguardente,

ainda que me aches “um porre”.

Nem coco verde, nem quenga,

nem coroa, nem caça-macacas,

Nem piranha, nem cotovia,

nem galinha, nem gata...  nem nada.

Basta!

Chega de metáforas e bajulações.

Quando me citares dentre os humanos,

não me trates de “homem”.

Eis, pois, que sou, simples e necessariamente,

MULHER.

Elias de França

sexta-feira, 2 de março de 2012




                                                  Invenção das coisas


                          Quando cai na terra, a chuva inventa coisas.



                          Silas Falcão

quinta-feira, 1 de março de 2012

Moto-Táxi

A assombrosa história da humanidade, num fabuloso épico, pode ser dividida em três etapas bem evidentes: o domínio do fogo, a percepção da roda e a invasão das motos-taxis.
                O fogo, como liberação de energia presa na matéria, incluindo aquele que arde sem se ver, foi penoso... Foi muito difícil para a raça humana domá-lo como a um corcel ígneo numa monta a pelo, na força bruta. Uma conquista primordial que nos aliviou de um grunhido na garganta, nos tirando da fase puramente animal e implantando um sorriso enigmático na aparência humana – embora alguns teimem em continuar com suas macaquices por aí – e de sobra ainda gerou uma boa literatura.
A fascinação pelas chamas era tanto que despertou delirantes fantasias, mitos incríveis, perversos deuses e os cinematográficos heróis que se encarnaram de nossas mentes. Isso aconteceu com um jovem andino, lá no mais alto das cordilheiras, que recebeu do filho do sol uma chispa de fogo e a escondeu entre o pó do ouro terrestre para amadurecer e brotar num pé de milho como reluzente vigor e néctar.
                O coitado do Prometeu, um Titã ladrão de fogo, foi quem mais sofreu, e aguentou resignado um interminável infortúnio pelo faminto bico de uma insensível águia a lhe degustar o fígado, diariamente, como um saboroso foie gras, e isso por tentar proteger a iníqua humanidade.   
                 Uma labareda foi o início, mas o bom mesmo foi o achado da roda. Quando um tronco de árvore rolou por uma encosta abaixo e um cidadão boquiaberto – já era um faber erectus no meio dos sapiens – deu o primeiro grito de eureka e sorriu de satisfação em adeus ao atrito de arrasto e do rolo ao disco foi um pulo.
                Um dia desses, vendo os pneus carecas de um velho Del Rey, lembrei-me de uma roda que foi encontrada nas ruínas da cidade de Ur, nas margens do rio Eufrates há 6000 anos, que poderia ter caído da carroça de Abrão, o patriarca dos hebreus, na saída para a inalcançável Canaã, e até que me tiraria do prego. Obriguei-me a ir comprar pneus, acenando para um moto-táxi que por ali ia passando.
                Se acaso o amigo(a) repetisse esse usual gesto, lá na cidade de Pequim, uma geringonça pedalada por um ciclista de olhos retesados pararia ao seu lado e lhe ofereceria uma corrida, pois é a moto-táxi da China, o Reino das Bicicletas e a nova babilônia do planeta, que está a encabeçar uma revolução para uma Nova Ordem Mundial (NOM) e que logo vai arrochar, de vez, a concórdia da humanidade, aguarde!
                As idéias que brotam deste impávido e colosso chão, chamado Brasil, são como um imenso clarão que reluz e vai logo concebendo um 14 Bis, uma Urna Eletrônica, um Coração Artificial, e até uma doce Rapadura. Por aqui, nos Sertões de Crateús, uma brilhante idéia também germinou na mente de dois visionários cidadãos, o Sitônio da Coelce e o Edilson Mourão, funcionário do Banco do Brasil, que imaginaram o sistema de Moto-Taxi, uma brilhante idéia que hoje é difundida por todo o país, facilitando a mobilidade urbana, comprovando assim que a necessidade é a mãe de todas as invenções.
O ponto mais agitado da nossa cidade é um diminuto quarteirão, no início da Rua Santos Dumont, entre o centenário prédio dos Correios e a Sede da Prefeitura, e quem se aproxima percebe um som familiar, repetidas vezes:
– Triiiiiiim! Triiiiiiiiim!  
– Moto-táxi, bom dia!
– Quero uma corrida para a Rua Frei Vidal, número 1500.
– Aguarde um instantinho, moço, a moto já está saindo.
E aquela senhora que já chegou ciscando pressa em desesperado alvoroço:
– Vamos! Depressa, vamos...
O mototaxista da vez, nunca saía sem um objetivo certo para a corrida. Estava cismado, mas naquela situação não tinha muito que pensar, foi. Só no caminho percebeu que era mais uma busca de uma ciumenta esposa por um marido que andava em pândegas. De bar em bar percorreram toda cidade, e nada.
– Siga para a Rua Francisco Mariano! Ordenou a desesperada senhora.
Benzeu-se, mentalmente o coitado, pois pressentiu mais um vexame de um triângulo amoroso. Pararam em frente à Casa de Pedra, entraram, e com os olhos de perscruta reviraram os quatro cantos daquele recinto libertino de amor e só o motoqueiro notou uma figura dissimulada, escapulindo por trás de uma porta. Calado estava, calado continuou, não queria assistir mais a um “quebra barraco” que presenciara outras vezes. Deixou a tristonha senhora em casa, esfriando a raiva, na espera do marido farrista.
Na hora do rush, Crateús vira um caos, um enxame com mais de 350 moto-táxi partem num vai e vem frenético, desesperados em revoada pelas ruas da cidade. Se, nesta hora, for atravessar uma rua, olhe bem para os dois lados ,e mesmo não vindo nada não passe ainda, com certeza vem uma moto-táxi veloz que você não viu. É tanta moto em profusão que aguçou a$ exigência$ da Companhia de Policiamento Rodoviário, CPRV do Governo do Estado, assustando o homem do sertão mais do que o flagelo do cavalo de Átila arrotando feroz calamidade.
                Depois do cruel latrocínio do motoqueiro Filomeno, os profissionais da moto ficaram mais diligentes, mesmo assim todo cuidado é pouco neste arriscado ofício. Uma vez um descuidado motoqueiro acertou uma corrida com o tal de Escadinha, foi uma questão de sorte, alguém viu e saíram no encalço para avisar ao incauto amigo. O meliante, pressentindo a perseguição das outras motos, desceu na altura dos Pastos Bons, mas não deu uma viagem perdida, assaltou, ali mesmo, uma fazenda de uma desprevenida empresaria citadina, fugindo no seu possante carro de passeio.
                A profissão de mototaxista compensa, numa terra de poucas oportunidades. Se tiver com todos os documentos exigidos pelo Sindicato e 15 mil reais para a concessão de uma vaga, é só se ambientar num dos 16 pontos espalhados pela cidade e cumprir uma rígida tabela de preços.
                Li outro dia, uma notícia interessantíssima, num desses jornais online, que a cidade de Nova York planeja legalizar os táxi-bicicleta.
Pensei comigo: “Meus Deus, acho que vou vender meu Del Rey e comprar uma magrela, quem sabe se mais essa nova profissão não chega logo por aqui...”

Raimundo Candido

Paulo Nazareno disse...
Saboroso,bem humorado, perspicaz dentre outros atributos. Que coisa Raimundinho!Só lembrando que daqui saiu também,pela luz do nosso confrade Lucas Evangelista, uma música (vendida por êle ao Mastruz com Leite) acerca do tema.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

ALC - NOTA DE ESCLARECIMENTO

Tendo em vista veiculação, neste blog (blognilos.blogspot.com), de debate construído na rede social facebook, envolvendo o nome da Academia de Letras de Crateús – ALC, em torno do Livro “Crateús: 100 anos”, publicado em 2011, por esta Arcádia, com o apoio do Banco do Nordeste, da Prefeitura Municipal de Crateús, através da Secretaria de Educação, dentre outros, vimos esclarecer:

1)      O livro tem abordagem histórico-antropológica acerca da centenária cidade de Crateús, sem qualquer pretensão de abarcar toda a história. Até porque, ao nosso entender, “toda” a história de um povo não cabe num único livro, quiçá alcançável. Mas o livro promove grande levante da nossa historia e antropologia, desde os tempos remotos das Tribos Karatis até os dias presentes;
2)      O livro não se destinou a biografar ou homenagear personalidades. Os muitos nomes citados nos artigos constam na condição de sujeitos históricos dos fatos ali relatados. Assim constam também as contribuições de Madrinha Francisca, Rosa Moraes e Dona Delite para a educação de nossa cidade, esta última, inclusive, têm três de seus filhos integrando a ALC, sendo dois como membros fundadores e uma como patronesse.
3)      Sendo um livro de artigos históricos, escritos por sujeitos pensantes/participantes da vida sociocultural e política, a abordagem dos fatos expressa a visão de cada pesquisador, vez que ninguém é neutro. Entretanto, todos os artigos são fundamentados nas fontes pesquisadas, nos relatos dos sujeitos e documentos de registro, segundo os princípios da metodologia de pesquisa acadêmica, o que lhes dá veracidade científica, até que outras teses, também à luz da ciência, os negue.
Alegra-nos ser nosso livro objeto de debate, pois é esta a finalidade de qualquer publicação. Mas alertamos que o juízo sobre o desconhecido, isto sim, pode resultar em injustiça irreparável. Recomendamos, pois, em glória de nossa cidade e de muitos dos seus sujeitos históricos, a leitura de todo o livro, subscrito por mais de 30 autores e outras tantas dezenas de contribuições, mediante entrevistas, documentos e informações. Assim feito, estamos abertos às críticas, contestações, antíteses e discordâncias, que ajudarão nós todos a nos auto reconhecermos como crateuenses.
O livro se encontra a disposição na nossa Sede, à Rua do Instituto Santa Inês, 231 – no Centro de Crateús.
Cordiais Saudações.
A diretoria da ALC

Convite aos Acadêmicos

Comissão Brasileira de Justiça e Paz
Organismo vinculado à CNBB

"Que a SAÚDE se difunda sobre a terra"
Lema da Campanha da Fraternidade 2012

Constitui objetivo específico da  CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2012 "despertar nas comunidades a discussão sobre realidade da saúde públca (...)" Engajada na mobilização nacional, A COMISSÃO DIOCESANA DE JUSTIÇA E PAZ, através de seus membros efetivos e suplentes, vem solicitar vossa prestigiosa presença e/ou de representante(s) dessa Instituição na REUNIÃO preliminar que fará realizar nesta Cidade, no SINDICATO DOS COMERCIÁRIOS, situado à Rua do Instituto Santa Inês, 413 - Centro (próximo ao Clube Sargento Hermínio), com início previsto para as 17:00h (CINCO HORAS DA TARDE) da SEXTA-FEIRA, DIA 02 DE MARÇO DE 2012.
(SIC)

sábado, 25 de fevereiro de 2012

O homem na minha cama


vou te dar um abraço nu
em pelo e suor
e me encaixar
feito pecinha de quebra-cabeça
em teu corpo
vou te dar beijos vestidos
em língua e salivas
onde possa saciar
a sede que me consome
vou te dar minha pele
perfumada em gozo
quando deitares na minha cama

Karla Gomes

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Viva! Crateús tem Carnaval

Foto: Júnior Sá

Depois de muito vai e vem, de muito disse-que-disse, de um "aparente" desinteresse da administração municipal e de muita pressão dos foliões crateuenses – que inundaram as redes sociais com apelos e protestos – finalmente está decidida a programação do Carnaval em Crateús.

Foi em cima da bucha, mas o que conta é que ele vai acontecer, malgrado a ideia de jerico de reavivar os famigerados "paredões de som" (vide o artigo "Ferro na Princesa", de Edilson Macedo).

A programação oficial traz, como principal novidade, a alegria de devolver o "corredor da folia" ao seu lugar de origem: a Praça dos Pirulitos! Só por esta atitude sensata, a prefeitura já leva um 10, com louvor, em minha modesta avaliação. Marcando pontos importantes no quesito "evolução", abandonou a lamúria do "não há dinheiro" e finalmente, no acender das luzes na avenida, contratou uma carrada de bandas – inté da Bahia, vejam só! Então, de sábado até terça-feira, a putaria vai comer é de esmola! – no bom sentido, é claro.

Até mesmo os Blocos Oficiais, que ameaçavam um boicote em razão dos poucos recursos oferecidos e dos atrasos no repasse desse dinheiro, correm feito doidos pra fazer bonito. A informação é que desfilarão pela avenida a sua história (Mandacaru), a história da música nordestina (Tykeré) e meu Ceará é assim (Malagueta). Sempre vale muito a pena conferir.

Quanto aos blocos alternativos, aí é outra história. É pau de dar em doido. A diversão é certa, a alegria é garantida. Chega a dar saudade do mestre Manoel Picolé e seu Ás de Espada. Oh tempos bons aqueles!

Enfim, a mesa está posta e os convidados todos avisados. Vamos à folia! Vamos cultuar outra vez esse deus doido da farra e do desatino. Se preocupe não: na quarta-feira a gente se prostra arrependido e roga mais uma vez a deus o seu perdão... pelo menos até o próximo ano.

Lourival Veras

                    Cícero Maçal, o Encantador de Cavalos.

Bem cedinho, mal as vassouras de piaçabas ciscavam as invisíveis poeiras nas calçadas – costume de quando os terreiros eram de terra batida e as casas de taipas – as patas de ferro já trotavam no rijo calçamento emitindo um firme e percutível som. Não li, até hoje, uma fiel e onomatopéica imitação deste belíssimo ruído, parece-me com um pa ta ti pa ta tá pa ta ti pa ta tá em ritmo veloz e harmonioso. Era um Manga Larga machador chamado “O Corcel” cavalgado pelo elegante Cícero Maçal, lembrando-me o atrevido Capitão Rodrigo Cambará de o Tempo e o Vento, que subia pela Rua Frei Vidal rumo ao centro da cidade, numa infalível visita aos seus digníssimos amigos.
           Antes, passava pela casa do Compadre Caboclo, na Rua São José, só para lhe apoquentar o juízo e dar um bom dia à Comadre Janoca, com um dedal fincado no dedo médio e a pedalar sem sair do lugar, numa antiguíssima máquina Singer.
            A criação de gado, desde a época do Ciclo do Couro, alojou-se nas margens do Rio Poti como uma coluna mestra a suportar e favorecer o lento desenvolvimento do município, mesmo padecendo de cruéis e periódicas secas que dizimaram a um quase inexistente rebanho.
           Como uma extensão da cidade, a Fazenda Boa Vista era anexada por uma alameda de altíssimos Paus Brancos, aonde os nômades ciganos se abrigavam com seus animais suspeitos.
            Na madrugada os galos entoavam seus cocorococós acordando toda passarada e os exibicionistas pavões. O vento balançava uma rede de tucum armada no arejado alpendre, de onde se via o fluir da carroçável, a levar os transeuntes apressadamente para o povoado do Quirino. Dali, seu Cícero, os convidava mesmo que não os conhecesse:
             – Apeiem-se, meus amigos, venham tomar um cafezinho!
             Após a lida de tocar o gado para a malhada e abastecer de ração os cochos da vacaria, inquieta-se com as condições reduzidas do capim na vazante da croa do rio, mas logo deixa a preocupação de lado para fazer o que mais gosta, o que realmente lhe dá prazer: o exercício de domar cavalos.
               Sabe que conquistar um animal, sem lhe tirar o brio, sem lhe reduzir a esbeltez e o fausto escultural da nobreza é obra de um raríssimo dom. Usando de instrumentos brandos chega ao seu coração, por dura disciplina e infinita paciência, conquista-o com aquela confiança que persistirá para o resto da vida, uma compreensão que está acima de qualquer raciocínio lógico. Só mesmo um mago encantador como Seu Cícero Maçal, para integrar cavalo-homem num só elemento, num só corpo a agir pela vontade do dono, num respeito mútuo, até as respirações se combinavam e ficavam no mesmo ritmo. 
               Quantas vezes, no comando da voz, o Corcel dirigia-se, instantaneamente, a sua presença, deixando os transeuntes boquiabertos daquela cega obediência a mostrar que o animal era mais que um cavalo pronto a montaria, mas um amigo que se trata com veneração, fazendo valer um antiguíssimo ditado: Mostra-me teu cavalo e te direi quem és...
               Um cavalo! Um cavalo! Meu reino por um cavalo. Gritou o Rei Ricardo III, lá na longínqua Inglaterra, antes de ser derrotado numa sanguenta batalha. Se tivesse encomendado ao Seu Cícero, teria sido salvo com um cavalo muito bem adestrado.
              Mesmo sendo uma pessoa pacifica e sossegada, a zelar pela retidão de caráter e pela honradez de seu mundo, tinha momentos de tolerância zero com os erros alheios, tornando-se temporariamente espoletado, como uma brasa apagada que recebe um vivífico sopro.
               O sujeito que levara as suas ovelhas, era um gatuno por vocação, não merecia mesmo um pingo de consideração, e Seu Cícero Maçal não deu a mínima atenção para aquelas frívolas ameaças de desforra. Mas o ódio, a vingança dos indivíduos covardes, queria ser despejado onde menos a razão o indicasse, pois é uma diabólica companhia e cega quem o abraça.
               O infiel gatuno, como um rato covarde, ronda pelo terreiro da Boa Vista e na visão do esbelto tordilho, livre a pastar por ali, enxerga o vulto de seu Cícero Marçal. Uma lâmina afiada resplandece ao sol, na mão de quem leva a infame perversão na alma.  
               Uma cena que sempre me causa compaixão, quando a leio, é a crudelíssima morte dos cavalos de Riobaldo Tatarana , no livro Grande Sertão Veredas, de João Guimarães Rosa. Estavam todos confinados na casa velha da Fazenda dos Tucanos, e por tiros inimigos vindos sem pena de Hermógenes e seus desumanos jagunços que ali os encantoam, enquanto todos os animais estavam guardados num curral fechado... É Riobaldo que conta:
             "(...) Mas, no sobrevento, o Cavalcânti se exclamou:
               — "A que estão matando os cavalos!..."

               Arre, e era. Aí lá cheio o curralão, com a boa animalada nossa, os pobres dos cavalos ali presos, tão sadios todos, que não tinham culpa de nada; e êles, cães aquêles, sem temor de Deus nem justiça de coração, se viraram para judiar e estragar, o rasgável da alma da gente - no vivo dos cavalos, a tôrto e direito, fazendo fogo! Ânsias, ver aquilo.”
               Sem temor de Deus, sem um pingo de justiça no coração o perverso gatuno desfere duas punhaladas mortais no corpo do inocente Corcel que sangra até cair.
               Correm para chamar Seu Cícero Maçal que não suporta o sofrimento do fiel amigo, não consegue olhar aquela difícil aflição. O veterinário, chamado as pressas, já desistiu e manda arrastar o animal para acabar de morrer na beira do rio.
               Uma comoção domina o alpendre da Fazenda Boa Vista, um peito fechado, uma intraduzível dor a se misturar com a crescente revolta, mas eis que, repentino, levantam o olhar e todos ficam incrédulos. Na estrada, o Corcel caminha vagaroso, penosamente puxando o passo que a pouco trotava pela Frei Vidal. Arrasta-se, rumo ao seu dono, como para a agonia da última despedida, pois somente no adeus frontal, olho no olho, somos capazes de compreender a profundidade de uma grande amizade ou de um incondicional amor, mesmo entre o ser humano e seu querido animal.
               Alguém viu cristalinas lágrimas escorrem da face do cavalo, que se foi sem um relincho, como um sopro de brisa que partiu a galopar deixando uma triste poeira daquele dolorido silêncio. Como os cavalos de Riobaldo, o Corcel tordilho de Seu Cícero Marçal partiu, trazendo a lembrança da poetisa Cecília Meireles que verteu estes versos para toda despedida equina:
Vi a névoa da madrugada
deslizar seus gestos de prata,
mover densidades de opala
naquele pórtico de sono.

Na fronteira havia um cavalo morto.
...

Mas todos tinham muita pressa,
e não sentiram como a terra
procurava, de légua em légua,
o ágil, o imenso, o etéreo sopro
que faltava àquele arcabouço.

Tão pesado, o peito do cavalo morto!

                                                                                                                       
Raimundo Candido.

Jose Alberto de Souza disse...
Bárbaro, pungente, comovedor,
digno das observações agudas
de um grande escritor

João Silas Falcão Soares disse...
Poeta, excelente resgate de memória. Inúmeras vezes presenciei o Cícero Maçal indo/vindo do centro de Crateús pela Rua da Cruz em seu Manga larga veloz e competente no trote. Sempre relembro esta magnifíca imagem. Nunca o vi dentro de um carro. Sempre achei muito personalidade dele não se desgarrar do Manga Larga.

Parabéns Poeta.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A tia da Graça

E assim se vão fechando, momento a momento, estas pérgulas por onde os raios de luz de minha infância, iluminuras de minha vida, emergiam. Última acha que ardia no lume do meu passado. Hoje uma sombra de saudade. Ancora sobre os meus dias. Os brilhos vão se escurecendo neste sítio bendito da memoria, onde as flechas tomam conta de nós. Onde estão aqueles sorrisos de graças que pousavam doçura sobre todos. Hoje se vai a última tia. A tia Gracinha. Morre Maria das Graças Bonfim. Aquela alegria pueril. Aquela fala mansa, qual um poema. Aquela apascentadora amiga, afogada em afagos, que explodia quando a aurora de nossas vidas ainda borbulhava. Um coração de Adamastor, carregando as pertenças do amor. Um mar generoso, leve, de um marulho silencioso, ia a querida Tia a nos trazer as graças da felicidade. O sol ainda ruminava no ventre da noite, a nossa mãe sazonal, nos enchia de mesuras. Hoje ela se vai, no dorso inquieto do tempo. Leva de cada um de nós mais de um quartil de viva felicidade. Ficamos nesta penumbra de anoitecer, com cheiro de cipreste nas canaletas da morte. Nestas cinzas que tingem tanta magia, naqueles dias distantes. De tardes fagueiras. De tantas noites telúricas sob o lume do luar. Sucumbimos ao passado. Pesarosos voltamos a Crateús para enfrentar estas esfinges famintas que nos devoram a todos. Apaga a última estrela de opala, como diz Bilac. Faz os nossos olhos vazios, lacuna na mente, pedra na alma e a dor infinita no peito. Tao somente o peso da saudade. Graça, que vestia o nosso luar de sedas e purpurinas. Que nos protegia dos açoites das noites. Hoje sobra este olhar marmorizado sobre o tempo. Perdemos a Graça, ficamos sem graça, a morte me parece ser esta veste estendida sobre a dor. Espargindo um bardo triste de lamento e saudade. 

Jose Maria Bonfim de Moraes
Cardiologista.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

                                                        É FERRO NA PRINCESA
                                                                                                           Edilson Macedo

            Deu na Gazeta do Centro Oeste: “Em Crateús, os paredões de som estão tomando chegada e se entocando para quando o carnaval chegar”.
            Meia Verdade não basta, Crateús terá, neste CARNAFORRÓ, concurso de Paredão, sim! É a genialidade de um povo cujo juízo derreteu sob o causticante sol que assola nosso DeSertão...
            O inferno é aqui , e aqui o galo canta ao meio dia, e reza braba nenhuma adianta, nem mandinga nem cara feia, que ninguém arreda o pé e o que é do diabo, o diabo há de levar... a Ética dos outros não nos atinge...
            E começo a acreditar na cosmologia dos Maias, que sentencia 2012 como fim do mundo. Eia!, é aqui mesmo que o apocalipse vai começar! E que Deus se apiede ao menos de nossos TEÚS...

            P.s.: E disse Giordano Bruno, antes de arder no Fogo Santo da Inquisição: “Que ingenuidade a minha, pedir ao poder, que reforme o poder!”